Título: Para Rodrigues, foi um ´desastre lamentável´
Autor: José Maria Tomazela
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/10/2005, Economia & Negócios, p. B4

O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, classifica de 'desastre lamentável' o foco de febre aftosa em Mato Grosso do Sul. Rodrigues condena o bloqueio de verbas - que retém R$ 78 milhões do ministério - e o possível uso de lotes de vacina vencidos como causas prováveis do surto. Ele disse que não pediu demissão ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. 'Mas eu disse, em mais de uma ocasião, e repito, que não estou feliz', afirmou o ministro em entrevista ao Estado. Neste momento, segundo ele, não é possível prever quanto tempo vai durar o embargo à carne brasileira. Enquanto não for identificada a causa da contaminação é difícil, na avaliação de Rodrigues, chegar a um entendimento com os importadores. A seguir, os trechos principais da entrevista:

Quaisosprocedimentosemrelação ao novo foco de febre aftosa?

Toda vez que surge um caso dessa natureza, os países suspendem as importações e enviam um questionário amplo ao país exportador. A UE já está mandando o questionário. Vamos mostrar que estamos cumprindo as regras internacionais.

O sr. está otimista em relação ao fim do embargo?

As causas ainda são obscuras. Pode ter ocorrido mutação do vírus, mas essa é uma hipótese remotíssima e tecnicamente resolvível com uma nova vacina. Existe a possibilidade de aplicação de vacina com validade vencida, que considero mais provável. Por fim, pode ter ocorrido falha na vacinação. Tudo está sendo investigado.

O governo estava preparado?

Tecnicamente, está preparado porque as regras internacionais são claras, não tem o que tergiversar. Era uma crise preanunciada? Era um risco que países como o Brasil e outros correm.

Osr.nãoalertavaparaesseriscodevido às restrições orçamentárias?

Houve confusão. Eu reclamei muito da crise agrícola. Essa sim era anunciada desde dezembro. Nós tínhamos um orçamento grande para defesa agropecuária, que foi reduzido a 20% e, depois, ampliado. Não é só falta de recursos. Se tivéssemos todo o dinheiro necessário e viesse um vírus mutante, nada adiantaria.

O ministro Palocci (Antonio Palocci, da Fazenda) disse que o dinheiro foi liberado. O ministério é que gastou pouco. Tudo isso em parte é verdade e precisa ser melhor trabalhado. Nós estamos com orçamento hoje de R$ 91 milhões para defesa sanitária, dos quais já empenhamos R$ 51 milhões. A maior parte dessa diferença iria para os governos estaduais.

Quem é o responsável?

combate à aftosa não é só responsabilidade do governo federal. É compartilhado. Quem cuida da vacinação e do controle são os Estados. O governo federal repassa recursos.

Os recursos foram suficientes?

É sempre menos que a demanda. Há uma corrente de responsabilidade, na qual o governo federal tem a menor parte em termos financeiros. Nós temos de sair desse negócio de falar 'a Fazenda não deu', 'o ministério recebeu, mas não aplicou', 'aplicou, mas não aplicou certo'.

O sr. considera resolvido o problema orçamentário?

Não considero. É preciso ver a liberação dos recursos. O que estou pedindo são os R$ 169 milhões previstos antes do contingenciamento. Com a contenção, estou com R$ 78 milhões retidos.

O que fazer para evitar novos casos de aftosa?

Há uma preocupação no governo de criar regras para punir empresários que não façam a aplicação da vacina.

O sr. chegou a pedir demissão por causa dessa crise?

Não, isso é especulação. Eu disse, em mais de uma ocasião, e repito, que não estou feliz. A luta continua. O meu cargo é de confiança do presidente. Eu não vou dizer que vou ficar 'ad aeternum' pois depende do presidente.