Título: A greve das federais
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/10/2005, Notas e Informações, p. A3

Das 52 universidades federais, 32 estão paradas. A maioria suspendeu suas atividades nas últimas semanas, mas algumas já estão em greve há quase dois meses. O motivo é o mesmo de sempre, ou seja, reivindicação de aumento salarial. Os professores pleiteiam um reajuste linear de 18%, a ser pago este ano, além da incorporação aos vencimentos da gratificação de estímulo à docência e o retorno dos adicionais por tempo de serviço. O governo apresentou duas contrapropostas, que resultariam num reajuste médio de 10%, a ser pago a partir de 2006.

Pela primeira proposta, o Ministério da Educação (MEC) oferece um reajuste de 50% no salário-base por titulação docente (especialista, mestre e doutor).

Atualmente, sem contar gratificações e vantagens funcionais, o salário-base pago nas instituições de ensino superior mantidas pela União é de R$ 701. O salário mais alto é de R$ 1.308.

São valores baixos, quando comparados com os salários de algumas universidades públicas estaduais, das universidades confessionais mais tradicionais e das universidades particulares mais conceituadas.

Pela segunda proposta, o ME C prometeu acolher uma antiga aspiração do Sindicato Nacional dos Docentes do Ensino Superior (Andes), incluindo no plano de carreira das instituições federais o cargo de professor-associado. Atualmente, os professores são divididos em quatro categorias, sendo a mais alta a de titular. No entanto, como o número de professores titulares é fixo e o cargo somente pode ser disputado em concurso de provas e títulos quando houver vaga decorrente de aposentadoria, renúncia ou morte, muitos professores acabam ficando represados na categoria de adjunto. Ou seja, não podem ser promovidos nem em termos funcionais nem em termos financeiros.

Com a criação de mais um cargo, o de professor-associado, como penúltimo degrau da carreira acadêmica, os atuais adjuntos poderiam ter um aumento salarial de 10%.

Para fechar o acordo, o MEC convidou a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e o Pró-Ifes - um sindicato criado este ano a partir de uma dissidência da Andes e mais alinhado com o PT - a participar das negociações. Além disso, prometeu destinar R$ 395 milhões, a contar de 2006, à implementação dessas duas propostas. Mas, com receio de que elas fossem rechaçadas pela Andes, dias após essa promessa as autoridades educacionais obtiveram mais R$ 105 milhões do Ministério do Planejamento, totalizando R$ 500 milhões.

O governo está otimista, confiante em que esses recursos e o apoio político da SBPC e do Pró-Ifes animarão os docentes a retornar às salas de aula. Menos otimista, a diretoria da Andes estima que os professores somente retomarão suas atividades se começarem a receber, ainda este ano, parte do que reivindicam.

Até o momento, a greve não afetou o cronograma escolar de 2005. Mas, se a paralisia durar mais uma semana, as autoridades educacionais prevêem que algumas das universidades federais e dos centros de educação tecnológica mantidos pela União poderão enfrentar problemas para realizar os exames vestibulares no prazo previsto, em dezembro. Se isso ocorrer, o calendário escolar ficará ainda mais confuso. Por causa da greve de 2001, que foi a mais longa de todas, com quase 100 dias de paralisação, e da de 2003, o último semestre letivo se encerrou depois de julho, originariamente mês de férias.

Esse risco poderia ser evitado caso o projeto de autonomia financeira e administrativa das universidades federais concebido pelo governo anterior tivesse vingado.

Por meio dele, cada instituição teria liberdade para definir políticas de carreira e de remuneração conforme seu orçamento e o perfil socioeconômico das regiões onde estão localizadas. Ao mudar as prioridades, o atual governo engavetou aquele projeto e lançou outro, politizando a gestão universitária.

O resultado não poderia ter sido pior. Sem apoio da sociedade, o projeto está parado. Com salários defasados, os docentes da maioria das universidades federais estão de braços cruzados.

E, por causa de disputas corporativas, os grevistas não conseguem chegar a um acordo com o governo.