Título: Cruzeiro do Oeste investiu esperança em Dirceu
Autor: Evandro Fadel
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/10/2005, Nacional, p. A7

Eleição de filho de Dirceu foi esperança até que o pai-ministro caiu em desgraça

CRUZEIRO DO OESTE - Há alguns anos, um morador de Cruzeiro do Oeste, a 570 quilômetros de Curitiba, no noroeste do Paraná, começou a espalhar, de forma jocosa, que havia uma cabeça de burro enterrada na cidade e uma aura de negatividade somente seria afastada com a mudança do nome. Justificava lembrando que a empresa aérea Cruzeiro do Sul havia falido, a revista Cruzeiro fechara, a moeda cruzeiro desaparecera e, na época, o próprio time mineiro não andava bem das pernas. Quando o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu deixou o cargo, a história da cabeça de burro foi lembrada. A esperança de boa parte da população estava depositada na possibilidade de, finalmente, aquele pedaço do Paraná ser altamente prestigiado. Afinal, o deputado federal pelo PT de São Paulo é pai do prefeito petista José Carlos Becker de Oliveira e Silva, de 27 anos. "Era algo que alimentava o sonho do cruzeiro-oestano", disse o ex-presidente interino do PT local, Adonias Sodré. "E não era só de Cruzeiro, mas da região, tanto que o Zeca foi eleito presidente da Associação dos Municípios de Entre Rios (Amerios) por aclamação." A Amerios reúne 32 municípios.

Proprietário do Supermercado Astral, Alexandre da Costa Santos ouve muita história de pessoas com reclamações pontuais sobre a atuação do prefeito. "Reclamam de estrada, de iluminação pública, do atendimento na saúde", citou. Mas ele supõe saber o motivo. "Todo mundo sonhava e achava que seria uma mágica. Ele assumiria e já asfaltaria toda a cidade, traria indústrias", comentou. "Agora o pessoal diz que está lento, mas acredito que não é por incompetência dele, mas porque está tendo poucos recursos."

Santos espera que Zeca Dirceu ¿ como o prefeito é conhecido, identificado no gabinete e como consta em alguns convites oficiais por ele expedidos ¿ realize uma boa administração. "Vejo potencial grande, pois é seguro, honesto, pé no chão e visita muito os bairros e a área rural", afirmou. "Ele está envolvendo a população, ao invés de deixar que fiquem esperando de braços cruzados."

A administração provoca sentimentos contraditórios e às vezes discussões calorosas. Num chaveiro, na entrada da cidade, Paulo César Fagundes e Orlando Rodrigues são só elogios. "Não deu nem um ano, mas o que fez está bom", atestou Fagundes. "Melhorou o serviço, valorizou os imóveis e o pessoal tem mais confiança no prefeito", reforçou Rodrigues. Com 48 anos de vida na cidade, ele se lembra de José Dirceu, que lá morou clandestinamente entre 1975 e 1979. "Eu o conhecia como Pedro Caroço e engraxei muito sapato dele", disse. "Toda hora que o via, ele estava lendo um jornal."

É quando chega no mesmo local Jandri Souza de Almeida. "Está péssimo por enquanto", opinou. Ele é entregador de compras de um mercado e percorre o interior do município. "As estradas estão ruins", ilustrou. No centro, disse que o problema são os buracos, que transformam o trânsito em um rali. Reclamação que a dona de casa Maria de Oliveira estendeu para o atendimento na área de saúde. "Três vezes precisei de ambulância para meu marido, que tem problemas mentais, e não me atenderam", revoltou-se. Segundo ela, os veículos estavam parados. "No restante (da administração) não tenho o que reclamar."

Não é o que pensa o proprietário do Restaurante Canaã, Everson Ratti de Castro. "A avaliação é negativa. Tem deixado a desejar", acentuou. "Basta olhar a sujeira."

Ex-prefeito e um dos poucos opositores políticos da atual administração, Yukio Tominaga (PPS) decretou: "O povo foi iludido." "Ele (Zeca) dava a entender que a cidade viraria um conto de fadas", disse. O ex-prefeito não escondeu a mágoa, pois Zeca Dirceu foi seu secretário da Indústria e Comércio entre janeiro e outubro de 2001.

Saiu acusando-o de superfaturamento em compras.

Mas a maior mágoa é contra o pai. "Ele veio usar do poder para derrubar um prefeito que estava fazendo um bom trabalho", acusou. "Veio fazer politicagem." Ressaltando que a campanha foi desigual, Tominaga acentuou que sabia que iria perder. "Mas decidi peitar o ministro e o filho do ministro", disse. O resultado apresentou 72% dos votos para Zeca, enquanto Tominaga, em segundo lugar, ficou com 17%.