Título: CPI dos Correios perde fôlego, ganha intrigas e teme pizza
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/10/2005, Nacional, p. A4
BRASÍLIA - Depois de quase 4 meses de funcionamento, a CPI dos Correios perdeu o fôlego. Há duas semanas não consegue reunir o número mínimo de integrantes para votar os mais de mil requerimentos apresentados e as investigações estão praticamente paralisadas pelo atraso na contratação de auditoria para decifrar os dados obtidos com a quebra de sigilo bancário e fiscal dos fundos de pensão de estatais e a intrincada movimentação financeira nas 75 contas do empresário Marcos Valério. Sem apresentar resultados concretos e sob risco de acabar em pizza, a CPI transformou-se nos últimos dias em palco para intrigas e bate-boca entre governistas e oposicionistas. O alvo predileto é seu presidente, senador Delcídio Amaral (PT-MS). Com problemas no PT de seu Estado, ele simplesmente não esteve em Brasília por 13 dias. Resultado: a CPI deixou de tomar decisões e nem sequer há uma agenda oficial de depoimentos para esta semana.
¿A CPI não está parada. O problema é que tem gente que só está a fim de holofote. É a bancada do holofote que mais reclama¿, reage Delcídio. ¿A CPI entrou numa fase mais investigativa e com as informações que temos haverá muitas novidades. Não há condições de transformar a CPI em pizza.¿
Ele faz mea-culpa e admite que imprimiu estilo ¿muito pessoal¿ à direção da CPI: ¿Às vezes as coisas não andam quando não estou.¿ Repudia ainda a idéia de que se armou uma rede de intrigas entre os parlamentares da CPI: ¿Isso é frescura. É ciúme de quem quer aparecer mais.¿ O fim dos trabalhos está marcado para 11 de dezembro, mas diante das dificuldades Delcídio diz que eles podem ser prorrogados até março, entrando pelo ano eleitoral.
FILIGRANAS
Governista de carteirinha, a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) também acha que existe ¿muita briga por holofote e gente querendo aparecer¿. Para ela, ¿isso acaba prejudicando o trabalho mais responsável de investigação¿. Ideli avalia que a CPI perdeu força porque ¿há teses que não foram confirmadas, como a do pagamento mensal a deputados para votar com o governo¿.
O relator, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), afirma que as investigações têm de ser imparciais. ¿A CPI não pode se traduzir em um palco político onde a situação e a oposição ficam discutindo filigranas.¿ A tensão atingiu níveis altos numa reunião da CPI a portas fechadas. O deputado Antônio Carlos Magalhães Neto (PFL-BA) acusa Delcídio de retardar a contratação da empresa de auditoria que examinará as operações com títulos públicos de dez fundos de pensão, feitas por meio dos Bancos Rural e BMG. Integrantes da CPI suspeitam que os fundos possam ser uma das fontes que alimentaram as contas de Valério, que repassou dinheiro para PT e aliados.
¿A CPI está degringolando. É uma locomotiva que não tem mais carvão¿, critica ACM Neto. ¿Esse pleito (a contratação da auditoria) foi feito há mais de um mês.¿ Ele ameaça não aceitar o posto de sub-relator dos fundos. ¿Não posso atropelar as normas legais para contratar a auditoria¿, defende-se Delcídio. A expectativa é que o caso seja resolvido esta semana.
Para o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), o governo age para esvaziar a CPI desde que começou a crise das denúncias contra o ex-deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) e a eleição de Aldo Rebelo (PC do B-SP) para dirigir a Câmara. ¿A situação está fazendo de tudo para impedir o avanço das investigações. É um desenho claro do que vem acontecendo, principalmente com a eleição do Aldo. Não é à toa que todos os deputados acusados de participar do mensalão ficaram tão felizes.¿
Ele ressalva que o trabalho da CPI já produziu efeitos, como as demissões em diretorias de estatais, entre elas Correios, Furnas e Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), além da saída de José Dirceu (PT-SP) da Casa Civil e da perda de status de ministro de Luiz Gushiken.
CHAPA BRANCA
Preocupados em não ficar marcados como integrantes de uma CPI ¿chapa branca¿, a maioria dos parlamentares jura não ver risco de ela terminar em pizza. Justificam o esvaziamento das últimas semanas dizendo que o foco das atenções foi transferido para a eleição na Câmara e o encerramento do prazo para troca de partido dos políticos que vão disputar as eleições.
¿Realmente os últimos 15 dias foram mais lentos. Além disso, é natural que as revelações da CPI tenham diminuído de impacto. Mas toda a história vai ser explicada e no final vamos ter uma bomba atômica¿, prevê o deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ). ¿Estamos em um fase de investigação que exige depoimentos que não têm o brilho da imprensa e, por isso, a CPI tem andando meio esvaziada¿, argumenta o deputado José Eduardo Cardozo (PT-SP).