Título: Iraque decide hoje se aprova Carta
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/10/2005, Internacional, p. A25

Sob forte esquema de segurança e ameaça de atentados dos grupos insurgentes, os eleitores iraquianos vão hoje às urnas nas 18 províncias do país para dizer "sim" ou "não" ao texto da nova Constituição. O referendo faz parte do cronograma de transição de poder, estabelecido pelas forças de ocupação americanas e o gabinete interino iraquiano. Se a Carta for aprovada, um Parlamento com plenos poderes será eleito até dezembro e dará posse ao novo governo. Caso seja rejeitada, a atual Assembléia Nacional provisória (Parlamento) será dissolvida e uma nova, também interina, será eleita em dezembro. Então, o país voltará à estaca zero para elaboração da Constituição.

Mas a previsão é que o texto seja aprovado hoje, uma vez que tem o apoio dos curdos (cerca de 20% da população) e da grande maioria dos árabes xiitas (60%). Entre os árabes sunitas (perto de 20% dos habitantes) a rejeição é ampla. De acordo com a lei, para ser aprovado o texto tem de receber o apoio de mais de 50% dos votantes. Além disso, não pode ser rejeitada por mais de dois terços em pelo menos de três províncias.

A comunidade sunita é maioria em quatro províncias, mas está divida entre os que votarão "não", os que boicotarão o referendo e os que não tiveram condições de registrar-se, por causa da violência.

No entanto, o principal partido sunita, o Partido Islâmico Iraquiano (PII), abandonou esta semana sua oposição, depois de um acordo com a coalizão de governo que garantiu a possibilidade de emendas à Constituição em 2006. Por esse acerto, ficou definida a criação de um comitê que estudará no ano que vem alterações no texto, caso ele seja aprovado hoje.

Esse recuo não teve o apoio de outros 19 grupos sunitas e tornou os membros do PII alvo de ataques armados ontem na capital e outras cidades. Extremistas explodiram a casa do líder do partido em Ramadi, 70 quilômetros a oeste de Bagdá, e jogaram bombas em sedes do grupo em Bagdá e Faluja. Ninguém ficou ferido porque os locais atacados estavam vazios.

Nos últimos dias, os grupos rebeldes intensificaram sua campanha de atentados com a finalidade de impedir o referendo, principalmente nas províncias de maioria sunita. Ao mesmo tempo, as forças de ocupação americana lançaram várias ofensivas no noroeste.

Essa violência impediu o registro de eleitores em amplas áreas sunitas. Muitos desconhecem até o local de votação. "Não há seções eleitorais em cidades como Haditha, Hit, Rawa, Qaim, Ana, Bagdhadi e vilarejos ao redor", queixou-se Mahmud Salman al-Ani, ativista de defesa dos direitos humanos em Ramadi. As cidades listadas por Al-Ani ficam na ProvÍncia de Anbar, região da operação militar americana. É a maior província sunita. Vários moradores de Ramadi, a capital provincial, se queixaram de não ter encontrado seções eleitorais e acusaram as autoridades federais de esconder os locais para evitar uma grande votação para o "não" entre os sunitas. Já a Comissão Eleitoral local assegura que há 77 seções em Ramadi.

Desde a meia-noite de quinta-feira as fronteiras do Iraque foram fechadas e assim ficarão até amanhã. Os vôos comerciais estão cancelados e o tráfego de automóveis entre as províncias foi proibido a partir das 18 horas de ontem. As ruas que dão acesso às seções eleitorais estão fechadas com blocos de concreto para impedir a entrada de carros-bomba.