Título: Frigoríficos da região afetada dão férias coletivas
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/10/2005, Economia & Negócios, p. B4

Os três frigoríficos localizados na região interditada pelo foco de febre aftosa em Eldorado, Mato Grosso do Sul, deram férias coletivas aos funcionários ontem e paralisaram as atividades por um período mínimo de 15 dias. Com a suspensão do abate e da comercialização de carnes, as empresas ficaram sem condições de absorver os custos diários do funcionamento. No frigorífico Boifran, de Eldorado, que abatia 500 bovinos por dia e processava mil toneladas de carne por semana, apenas 10 dos 600 funcionários continuam trabalhando na manutenção.

Segundo o diretor Eduardo Ramalho, a retomada das atividades vai depender da rapidez com que o embargo à venda de carne seja resolvido. "É preciso que possamos voltar a operar já na próxima semana." O desossador Antonio Costa espera retornar rápido ao trabalho. "Tenho filho pequeno e não é o tipo de férias que gosto de tirar."

No frigorífico Bom Charque, de Iguatemi, também na zona sob emergência sanitária, que abatia de 800 a 1.000 bois por dia, os 1.100 funcionários entraram em férias. A situação, segundo a empresa, é mais complicada porque a maior parte da produção era exportada. O frigorífico Iguatemi, na mesma cidade, operava ontem com 30% dos 320 funcionários.

Com a suspensão do abate de 500 bois diários, apenas o setor administrativo estava funcionando. A paralisação pode ser total a partir de segunda-feira. Segundo o gerente industrial Roberto Rocha, o embargo causado pela aftosa surgiu num momento em que a empresa começava a se recuperar de um ciclo de preços ruins, principalmente para os derivados, como a farinha de carne, miúdos e tripas. "Abatemos 555 bois na segunda-feira e não pudemos cortar."

O estoque, mantido em câmara fria, inclui 160 bois do pecuarista Márcio Margatto, cliente do frigorífico. "Fiquei numa situação ruim, pois tenho compromissos para saldar."

EMERGÊNCIA

O prefeito de Iguatemi, Lídio Ledesma, decretou situação de emergência no município em razão "dos graves prejuízos econômicos e sociais" provocados pela aftosa. Os dois frigoríficos são os principais geradores de empregos na cidade de 15 mil habitantes. Em Iguatemi, a prefeita Mara Caseiro (PDT) reuniu representantes do governo, dos frigoríficos, sindicatos, associações comerciais para discutir a crise.

Além do frigorífico, um laticínio também fechou e os produtores de leite estão perdendo a produção. Mara pode decretar estado de emergência na segunda-feira. Na cidade de 12 mil habitantes, a agropecuária responde por mais da metade do Produto Interno Bruto (PIB) anual, de R$ 36 milhões. Pecuaristas e donos de frigoríficos pedirão ao governo estadual a criação de um corredor sanitário, possibilitando o abate de bois vindos de outras regiões.

"Não há razão para manter a indústria parada, pois a carne desossada não oferece risco", disse Ramalho, do Froiban. Ele lembra que, após um foco de aftosa em Naviraí, numa região próxima, em 1999, foi liberado o transporte de carne sem osso por corredores sanitários, controlados por barreiras.

O frigorífico Iguatemi vai entrar com ação de indenização contra o governo de Mato Grosso do Sul para ressarcir os prejuízos que vem sofrendo com o surto de aftosa. A medida será tomada se a proibição de abates se mantiver a partir de segunda-feira. Segundo o gerente Roberto Rocha, a empresa entende que o foco surgiu em decorrência da omissão do Estado.

A Agência de Defesa Sanitária Animal e Vegetal (Iagro), órgão estadual que interditou o frigorífico, deveria ter evitado o aparecimento da aftosa. "Se foi omissa, deve arcar com a responsabilidade." Segundo Rocha, o custo de um dia parado é absurdo e o frigorífico não tem culpa de não poder trabalhar. Além disso, a imagem da empresa será afetada pelo não cumprimento dos contratos com os clientes. "Temos compromissos financeiros que não vamos poder cumprir, o que é constrangedor."

SUPERMERCADOS

A febre aftosa não afetou até o momento as vendas de carne nas grandes redes de supermercados do País. A queda das exportações, que poderá elevar a oferta no mercado interno, também ainda não teve reflexo nos preços. O Wal-Mart informou ontem que, se a oferta for grande e os preços caírem, toda a economia será repassada aos consumidores. O Pão de Açúcar suspendeu as compras de carne de Mato Grosso do Sul e também não registrou queda no consumo nem alterou preços. O Carrefour informou que suspendeu compras de frigoríficos de regiões afetadas e está mantendo o volume de vendas de carnes de toda a espéc ie.