Título: Dados indicam descaso do governo
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 15/10/2005, Economia & Negócios, p. B4

O Ministério da Agricultura relaxou no controle sanitário das fronteiras do Brasil, mostram dados do Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), programa do Tesouro Nacional que monitora os gastos do governo. Entre 2000 e 2002, o Executivo federal gastou em média R$ 39,4 milhões por ano na fiscalização do trânsito internacional e interestadual de animais e vegetais. Nos dois primeiros anos da administração Lula, essa média caiu para R$ 21,1 milhões e, em 2005, o investimento nessa rubrica até 10 de outubro não passava de R$ 2,2 milhões. Uma das hipóteses levantadas pelos técnicos para o foco de febre aftosa no Mato Grosso do Sul é que ele tenha sido provocado por animais contrabandeados do Paraguai. Essa suspeita é coerente com os números das verbas aplicadas na vigilância de fronteiras com outros países. No caso do trânsito de animais, por exemplo, a fiscalização internacional recebeu R$ 311.846 este ano e R$ 443.599 em 2004, ante R$ 3.557.505 em 2002 e R$ 3.553.183 em 2001 - quase 10 vezes mais.

CULPADOS

O ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, chegou a responsabilizar a área econômica pela carência de verbas da Secretaria de Defesa Agropecuária, mas, na verdade, ele também tem culpa pela situação.

Os números do Ministério do Planejamento mostram que Rodrigues sofreu, no início do ano, um bloqueio de 43% dos recursos previstos no seu Orçamento (R$ 1,17 bilhão). Coube ao ministro escolher onde cortar e ele acabou sacrificando proporcionalmente mais a área de defesa agropecuária, que perdeu 79% dos recursos orçados. Só recentemente essa situação começou a ser contornada, com novas liberações por parte do Ministério da Fazenda, que não chegaram a tempo de evitar o problema.

Além de ter investido pouco na fiscalização do trânsito de animais, o Ministério da Agricultura também aplicou pouco nas atividades de prevenção de doenças. Na erradicação da febre aftosa foram usados (liquidados, na linguagem orçamentária) apenas R$ 2,74 milhões em 2005, até outubro - R$ 2,16 milhões especificamente em um foco surgido no Pará.

O mesmo tem ocorrido com a prevenção de outras doenças de bovinos, como a raiva, a tuberculose, a brucelose e a encefalopatia espongiforme (doença da vaca louca), que receberam pouco mais de R$ 500 mil neste ano. Essas despesas estão reunidas numa rubrica orçamentária chamada Desenvolvimento da Bovinocultura, que inclui ainda incentivos para o uso de material genético.

Aparentemente, segundo os técnicos que acompanham o Siafi, o governo estava despreocupado em relação aos riscos de um foco de febre aftosa.

Tanto que, no meio da dita escassez de recursos, priorizou gastos menos urgentes, como o pagamento da contribuição brasileira ao Centro Panamericano de Febre Aftosa, no valor de R$ 2,17 milhões.

Além disso, a assessoria do deputado distrital Augusto de Carvalho (PPS), do Distrito Federal, detectou que o crédito extraordinário concedido ao Ministério da Agricultura no ano passado para o combate à febre aftosa, no valor de R$ 18 milhões, tem sido canalizado majoritariamente para despesas de viagens e para a compra de veículos. Entre 2004 e 2005, já foram gastos R$ 4,5 milhões na aquisição de 114 automóveis, sendo 82 da marca Volkswagen e 32 Nissan, com tração nas quatro rodas.