Título: Corte não favorece Natal, diz empresário
Autor: Fernando Dantas
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/10/2005, Economia & Negócios, p. B7

O mercado financeiro já espera que o Banco Central (BC) reduza a Selic, a taxa básica de juros, até cerca de 17% em fevereiro, antes de dar uma parada para avaliar os resultados do ciclo de relaxamento da política monetária. Ontem, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC cortou a taxa de 19,5% para 19%. "Não acredito que eles vão acelerar os cortes além do ritmo de 0,5 (ponto porcentual) por reunião", diz Alexandre Pavan Póvoa, diretor da Modal Asset Management, no Rio. Póvoa prevê que, com a taxa em 17% em fevereiro (o que significa quatro cortes mensais consecutivos de 0,5), "o BC pare para dar uma olhada e retome os cortes no terceiro trimestre, terminando o ano em 15,5%". A previsão média do mercado para a Selic no fim de 2006 é de 16%.

Octavio de Barros, economista-chefe do Bradesco, observa que pode haver "alguma ansiedade" por causa de um repique episódico dos índices cheios de inflação, que talvez apareça já no IPCA-15 que está sendo divulgado hoje. Mas ele vê um cenário otimista à frente, e endossa a previsão de cortes seguidos da Selic até fevereiro.

Para Barros, que projeta o IPCA (o índice que serve de meta para o Banco Central) em 4,5% em 2006, exatamente no centro da meta, a grande âncora da inflação no próximo ano serão os preços administrados. Com a forte deflação no atacado em 2005, os IGPs, que indexam muitos contratos de serviços de infra-estrutura, devem fechar o ano abaixo de 2%, segundo a previsão média do mercado.

Póvoa tem uma visão um pouco menos otimista, embora longe de qualquer alarme. Inclusive o Modal tinha uma projeção de corte da Selic de 0,25 na última reunião, o que, para o economista, "daria um grau maior de liberdade ao BC". Na sua visão, tendo acelerado para o ritmo de corte de 0,5 ponto porcentual, o Copom fica numa situação desajeitada para voltar a 0,25, se por acaso julgar necessário.

SEM SINAIS DE STRESS

Os receios de Póvoa derivam da sua análise dos recentes solavancos no mercado internacional, que têm derrubado a bolsa no Brasil, por causa de ameaça de mais inflação nos Estados Unidos, o que levaria a taxas de juros americanas mais altas do que o anteriormente previsto.

"Todo mundo conta com um cenário externo favorável e vê as oscilações recentes como algo de curto prazo, mas eu acho que vai haver um aumento de aversão a risco." Para o economista, apesar de as economias emergentes terem melhorado os seus fundamentos, há muito dinheiro que poderia sair do Brasil, caso o cenário internacional piorasse ainda mais. Isso poderia mexer com a taxa de câmbio e alterar o cenário positivo percebido pela maior parte do mercado e pelo BC.

Ele prevê que, em termos do ambiente internacional, haverá no futuro, a curto prazo, "no mínimo um cenário bom, mas com muita volatilidade". Para Póvoa, "se chegará a estragar ou não a festa dos emergentes só veremos com o tempo, mas certamente não será mais unidirecionalmente positivo".

Por enquanto, porém, no principal termômetro, o mercado de câmbio, não há sinais de stress. O mercado vem notando a intensidade das compras de dólar pelo BC, que podem ter alcançado de US$ 2 bilhões a US$ 2,5 bilhões só em outubro, o que não inclui as compras que o Tesouro também fez.

TARDE DEMAIS: O presidente do Instituto de Desenvolvimento do Varejo (IDV), Flávio Rocha, afirmou ontem ao 'Estado' que, apesar da queda de 0,5 ponto porcentual na taxa básica de juros (Selic), as vendas de varejo do Natal já estão comprometidas. Para Rocha, que também é vice-presidente da Riachuelo, o corte veio tarde e a política monetária do Banco Central (BC) já provocou prejuízos para o varejo, que espera um Natal pouco aquecido este ano. "Se empatar com o do ano passado, vamos levantar as mãos para o céu. Para outubro e novembro, as cadeias de varejo estão comprando apenas 1,5% a mais do que no ano passado." O presidente do IDV está convencido de que, com período de deflação dos últimos meses, a taxa de juros real atual está mais alta do que quando o Copom efetuou o primeiro corte, de 0,25 ponto, na Selic. "Então eles não fizeram nada. Engraçado que o juro real tenha desaparecido do vocabulário deles. Somos reféns de uma relação promíscua entre eles (Copom) e os banqueiros." Rocha, que classifica os dois últimos cortes da Selic como "esmola", defende maior abertura do Copom para representantes da sociedade civil - hoje o comitê é formado apenas por diretores do BC. "Cito como exemplo o Fed, que é um conselho no qual estão refletidos os diversos segmentos da economia americana."