Título: Governo pode ir ao STF para tirar caso Daniel da CPI
Autor: Leonencio Nossa, Rosa Costa
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/10/2005, Nacional, p. A12

Planalto quer impedir que, no dia 26, Gilberto Carvalho seja posto frente a frente com irmãos de prefeito de Santo André

A acareação entre o chefe de Gabinete do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu velho amigo Gilberto Carvalho, e os dois irmãos do prefeito de Santo André, Celso Daniel, marcada para a quinta-feira da semana que vem, na CPI dos Bingos, começa a preocupar o Planalto - e ontem mesmo o líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), começou um movimento para esvaziá-la, ou se possível impedi-la. Numa entrevista no final da tarde, ao deixar a Granja do Torto, Chinaglia avisou que um senador ou um partido da base aliada poderá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) "para impedir que a CPI dos Bingos extrapole seu foco de investigação". Na prática, o governo pretende evitar que, depois desse confronto entre Carvalho e os irmãos Bruno e João Francisco Daniel, a CPI abra uma nova frente de investigação sobre o assassinato do ex-prefeito. Chinaglia tinha acabado de participar de uma reunião de coordenação política com o presidente e vários ministros. A decisão de recorrer ao STF, segundo ele, não deve ser uma ação do governo, mas do Legislativo. "Se em algum momento esta CPI extrapola aquilo que constitucionalmente é determinado, é mais razoável que um senador ou partido o faça", explicou.

A proposta de recorrer ao STF contra decisões da CPI dos Bingos havia sido admitida pelo ministro de Relações Institucionais, Jaques Wagner. Chinaglia rebateu também as críticas do PFL, que ameaçou instalar uma CPI específica para o caso Santo André se a proposta do recurso vingar. "Se o PFL acha que a polícia paulista, o Ministério Público, e todos os órgãos envolvidos na investigação de Santo André não são suficientes para fazer o papel de delegacia e Ministério Público, então o partido deve se envolver e fazer esse papel", disse ele. "Transformar a CPI numa propriedade do PFL é um erro." Chinaglia não comentou se o governo recorrerá à Justiça contra a acareação.

IRRITADOS

No Congresso, integrantes da CPI reagiram com irritação. "É de se perguntar: por que o governo quer assumir a defesa de suspeitos de corrupção e até de homicídios?', questionou o relator da CPI, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), ao ler a nota em que os membros da comissão repudiam a iniciativa do ministro Jaques Wagner de apelar ao STF. Para o relator, além de "extemporânea e indevida", a ameaça do ministro é inútil porque não mudará os rumos da comissão. Segundo ele, "o governo não tem legitimidade, nem jurídica, nem ética, para impedir o amplo poder de investigação do Congresso".

O relator afirma na nota que o objetivo do ministro é um só: "O de que o Judiciário diga ao Senado o que ele pode ou não pode fazer'. Segundo ele, como não há ofensa aos direitos individuais, Jaques Wagner quer, na realidade, interferir no Supremo, "guardião da Constituição e mesmo do governo, no interesse da lisura da investigação".

Os dois irmãos do prefeito, João Francisco e Bruno Daniel, acusam Gilberto de ter relacionado a morte de Celso Daniel com o esquema de corrupção instalado em Santo André. O líder do PFL, senador José Agripino (RN), avisou que a tática do Planalto "pode levar o povo indignado à porta da CPI, em defesa da investigação". Para o líder do PSDB senador Arthur Virgílio (AM), o prefeito assassinado "virou um fantasma que assombra o governo".