Título: Delúbio Soares é expulso do PT
Autor: Mariana Caetano e Fausto Macedo
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/10/2005, Nacional, p. A8

Delúbio Soares, acusado de criar o mensalão, foi expulso ontem do PT. Reunido desde as 10 horas da manhã, o Diretório Nacional votou o parecer da Comissão de Ética, que recomendava a exclusão do ex-tesoureiro do partido - 3 dirigentes se abstiveram, 16 pediram uma pena mais branda para o réu (suspensão por 3 anos), 37 acolheram o libelo contra Delúbio e o mandaram para a rua. O ex-guardião do dinheiro do partido não testemunhou seu fim na agremiação. Antes que a votação fosse iniciada, ele deixou a sede do partido, no centro de São Paulo, em seu Ômega blindado, às 16h40. Deixou para trás uma história de 25 anos de militância, um clima de constrangimentos e cópias de seu derradeiro recurso, uma carta de 19 páginas que leu para seus pares.

Um trecho do documento soou como um recado para os que viraram as costas para ele: "Tranqüilizem-se os que a mim vieram pedir ajuda porque seus nomes não brotarão da minha boca, ainda que o meu não saia das deles. Mas não aceito ser oferecido em sacrifício para saciar o apetite das forças conservadoras deste País." Delúbio emprestou um tom emotivo ao seu discurso. Por várias vezes, interrompeu o relato e chorou.

A votação rachou o Campo Majoritário, corrente de Delúbio e do presidente Lula. O ex-ministro José Dirceu votou pela suspensão temporária. Acompanharam Dirceu o novo tesoureiro, Paulo Ferreira, a mulher de Delúbio, Mônica Valente, além de Vera Gomes, da Executiva Nacional da CUT. João Felício, presidente da CUT e secretário sindical do partido, defendeu a proposta - o réu iniciou sua militância política como dirigente da Central Única dos Trabalhadores.

"Temos que parar com essa hipocrisia porque todo mundo ligava para o Delúbio pedindo dinheiro e ele tinha que se virar", asseverou Felício, tentando livrar o companheiro da punição máxima. Quando chegou para a reunião, Felício enfatizou: "Outrora, o Delúbio era um gladiador bastante eficiente. Agora querem jogá-lo na arena para que os leões possam devorá-lo."

Ricardo Berzoini, novo presidente do PT, e Tarso Genro, que deixou o cargo ontem, votaram pela expulsão, assim como o senador Aloizio Mercadante (PT-SP). "É um momento muito doloroso, mas a expulsão é uma decisão inevitável ainda que considere que ele (Delúbio) sempre agiu achando que estava contribuindo para o partido", enfatizou o senador, que teve o voto seguido pelo assessor especial da presidência, Marco Aurélio Garcia, e o novo coordenador do Grupo de Trabalho Eleitoral, Gleber Naime. As 3 abstenções saíram de integrantes da corrente trotskista O Trabalho, que defendia punição coletiva para os responsáveis pela crise, culpando a política de alianças do governo Lula.

Depois da expulsão de Delúbio, a cúpula do partido do governo disse não temer que o ex-tesoureiro abra a boca e revele segredos do mensalão. "Por que o PT temeria revelações de Delúbio?", desafiou Tarso. "Não há nenhum motivo de temor. Quanto mais se aprofundarem as investigações e se definirem as responsabilidades, melhor para o partido."

Ele avalia que a pena capital aplicada ao ex-tesoureiro "foi uma decisão muito madura, com apoio no relatório sério, muito bem fundamentado que não tinha nenhum tipo de ranço de disputa pessoal". Para ele, o resultado final "foi um ato de justiça, muito bem pensado, elaborado e discutido, com fundamento em provas". Tarso disse que "não se considera de alma lavada porque é um momento muito duro para o partido". "O PT não tem medo da verdade", destacou Berzoini. "Não há nenhuma preocupação com relação a revelações de Delúbio." O novo presidente lembrou que "é importante lutar por uma reforma política que viabilize o financiamento público de campanha porque um processo privado leva necessariamente a desvios e isso significa por exemplo as recentes denúncias envolvendo pessoas do PSDB".

Para evitar sua expulsão, Delúbio chegou a arriscar uma manobra, ainda na sexta-feira. Esboçou uma carta com pedido de desfiliação, alegando que era um gesto de sua parte "para evitar desgaste no partido". Desistiu da estratégia quando foi informado que Tarso Genro colocaria de qualquer forma em votação o relatório que o acusa de "gestão temerária e improbidade" na função de caixa do PT.

Ontem, frente a frente com seus algozes, que um dia foram seus companheiros, Delúbio revelou porque se convenceu a não deixar o partido por iniciativa própria. Contou que uma irmã mais nova, que se filiou ao PT em 2002, ligou para ele e fez um apelo para que não deixasse o partido "a quem entregou sua vida". A irmã de Delúbio, que é professora, disse que a renúncia seria uma "confissão de culpa". Aos dirigentes que iriam julgá-lo dali a pouco, o ex-tesoureiro disse que "uma força maior" o impedia de assinar a desfiliação. O ex-tesoureiro pode recorrer da pena.