Título: Rivais no referendo, frentes querem se unir
Autor: Adriana Carranca
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/10/2005, Metrópole, p. C5

Até ontem em lados opostos, integrantes das Frentes Parlamentares Por um Brasil sem Armas e Pelo Direito da Legítima Defesa vão se reunir nesta semana para criar uma frente única. O objetivo é esclarecer a população e fazer cumprir o Estatuto do Desarmamento. Líderes das frentes pelo sim e pelo não concordam em um ponto: as campanhas de ambos os lados, no ar por 22 dias, deixaram mais dúvidas do que certezas na cabeça dos brasileiros. A frente única pretende reunir não só parlamentares, mas representantes da sociedade civil e da iniciativa privada. Entre os objetivos, estão o financiamento de uma campanha para esclarecer a população sobre os principais pontos da lei, aumentar as discussões sobre segurança e pressionar o governo para que se cumpra o Estatuto do Desarmamento. Os grupos também querem mais investimentos no combate ao porte ilegal e ao tráfico de armas e no controle das fronteiras do País. Outra questão prioritária, segundo representantes das frentes, é a implementação do Plano Nacional de Segurança Pública pelo Ministério da Justiça, acusado de engavetar o projeto.

"O momento delicado da vida política, com denúncias constantes de corrupção, desviou a atenção do referendo. Houve pouco tempo para o debate e a reflexão", avalia o superintendente do Instituto Sou da Paz, José Roberto Bellintani, integrante da frente pelo sim. "As campanhas foram muito apelativas e pouco educativas, com argumentos ruins e meias-verdades dos dois lados. Muitos votaram sem saber a diferença entre posse e porte de armas, por exemplo. Sou contra profissionais de marketing fazendo a cabeça das pessoas em votações."

Segundo Bellintani, o objetivo de ambos os lados agora deve ser conquistar o bem-estar social, transformar a cultura da violência e melhorar a gestão da segurança pública. O primeiro passo, diz, seria investir em uma campanha nacional de esclarecimento sobre o Estatuto de Desarmamento, sancionado em dezembro de 2003, para que a sociedade pressione o governo a fazer cumprir a lei.

Um segundo passo seria organizar fóruns públicos para ampliar as discussões e apresentar propostas concretas ao governo para melhoria da gestão da área. "A segurança pública ainda é papel do Estado, mas é necessário que os cidadãos se envolvam mais. Uma coisa ficou clara com o referendo: existe uma grande insatisfação da população nessa área."

PLANO DE SEGURANÇA

A nova frente pretende pressionar o governo para que aplique integralmente o Plano Nacional de Segurança Pública. Segundo o deputado Luiz Antônio Fleury (PTB-SP), vice-presidente da frente parlamentar pelo 'não', apenas 25% dos R$ 120 milhões previstos para este ano foram investidos até setembro. Para a próxima semana, Fleury vai pedir uma audiência com o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, com a presença de representantes das duas frentes e de organizações da sociedade civil, para pedir a liberação dos recursos para a implementação do plano.

"O Plano não pode ser esquecido. Ele é um instrumento com mais de 200 páginas para a criação de um sistema único de segurança no País. Foi discutido durante dois anos com técnicos, gestores e cidadãos, bem recebido no Congresso e aceito pelos 27 governadores, mas esquecido pelo governo federal", diz o antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, um dos elaboradores do projeto. "Independentemente do resultado do referendo, é fundamental que todos se unam em torno da implementação do plano."