Título: ONU cobra: corrupção dá cadeia no País?
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/10/2005, Metrópole, p. C9

A ONU cobra do governo brasileiro uma informação que muitos no País também gostariam de saber: quantos no Brasil já foram condenados por crimes de corrupção. A questão foi colocada pelo Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, que, desde ontem, em Genebra, faz uma sabatina sobre os direitos humanos no País. O governo respondeu que não há como saber quantos já foram julgados e condenados por corrupção nem por violação aos direitos humanos. O referendo que decidiu pela manutenção da venda de armas no País também foi discutido na sabatina. Mario Mamede, subsecretário de Direitos Humanos do Brasil, afirmou que o governo terá de mostrar à população que o resultado do referendo não tornará mais fácil a compra de armas, além de dar uma resposta ao sentimento de insegurança da população.

Em relação à corrupção, Mamede explicou que o País ainda não conta com um sistema de coleta desse tipo de dados e apontou que uma resposta poderia ficar para a próxima sabatina, em 2010. Ele declarou que o País conta com o número de pessoas presas por corrupção na gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo Mamede, foram 1.200 pessoas presas por corrupção, entre elas 819 políticos. "Mas não há um sistema integrado que nos permita saber quantos já foram condenados por corrupção."

"É até infantil dizer que não existe uma maneira de obter os números" , afirmou Hélio Bicudo, que acompanhou a reunião em Genebra como um dos representantes da sociedade civil. "Os números existem. Por que não podem ser dados?", questionou um representante da Human Rights Watch.

A ONU destacou que os casos relatados de corrupção no Poder Judiciário contribuem para a "impunidade de crimes de direitos humanos". Por isso, quer saber o que está sendo feito para garantir a imparcialidade e transparência do Judiciário. Mamede reconheceu que o Judiciário é um "gargalo" no acesso à Justiça e aos direitos humanos no Brasil.

A ONU pediu ainda informações sobre quantos já foram condenados pelo assassinato de trabalhadores rurais, quem são os políticos e juízes envolvidos em trabalho escravo e quantos processos existem contra autores de crimes contra mulheres e crianças. Mamede disse que o governo já começou a trabalhar na coleta de informações sobre crimes de violação aos direitos humanos, mas que um resultado só deverá existir em 2008.

No primeiro dia da sabatina, Mamede insistiu em apresentar todas as ações existentes no País. Irritada com a falta de detalhes, a presidente do Comitê, Christine Channet, deixou a reunião por alguns momentos. Ela chegou a interromper a delegação, alertando que a sabatina não poderia ser apenas "um monólogo, mas, sim, um diálogo entre os peritos e o governo". Entediada, uma das peritas, Elisabeth Palm, preferiu abrir um livro de literatura durante a sabatina.

A sabatina da ONU termina hoje, mas as ONGs brasileiras e internacionais já deixaram claro que não estão satisfeitas com o desempenho apresentado pelo País.

"Nem o PT nem Lula deram prioridade aos direitos humanos, pois isso não dá voto", afirmou Bicudo.