Título: Salvados do incêndio
Autor: Dora Kramer
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/10/2005, Nacional, p. A6

Antigos aliados já pensam em tirar proveito eleitoral da guerra entre PT e PSDB A guerra que se avizinha de extermínio entre PT e PSDB, e um possível esgotamento por parte do eleitorado em relação a projetos já testados, alimenta em partidos outrora aliados a um e outro o desejo de herdar as cinzas.

Nutrem a esperança de que na disputa pela Presidência da República no próximo ano haja espaço, e chance real de vitória, para candidaturas alternativas, fora do cenário de enfrentamento direto apenas entre tucanos e petistas.

"Quem pensa que a eleição de 2006 vai repetir a de 2002 engana-se e não leva em conta as mudanças ocorridas na cabeça da população em função de todos os episódios vividos na crise", avalia o deputado Roberto Freire, ele mesmo candidato do PPS que na eleição passada aliou-se à candidatura de Luiz Inácio da Silva.

No PMDB e no PFL, dois partidos tidos como possíveis parceiros das forças consideradas principais, nos últimos dias há intensa movimentação e conversações recíprocas sobre a possibilidade de formar uma outra aliança.

Há a avaliação de que o PSDB e o PT podem se perder em discussões sobre "o mesmo". A saber: quem fez o governo mais ou menos corrupto, quem inventou a política econômica, de quem é a autoria das políticas sociais e assim por diante.

Nesse quadro, o eleitorado poderia rejeitar a ambos, repudiando a dicotomia posta como um imperativo não necessariamente real no tocante à pluralidade de posições existentes na sociedade.

Na eleição de 2002 mesmo houve uma tentativa de fugir da contraposição entre as duas forças auto-eleitas como adversárias, donas da exclusividade na disputa: primeiro o eleitor foi para o lado de Roseana Sarney, do PFL, em seguida aproximou-se de Ciro Gomes, então no PPS, e só depois acomodou-se junto a Lula.

Agora, os partidos tratados como satélites do PT e do PSDB imaginam tirar proveito do acirramento entre os dois. Na interpretação deles, ambos ainda irão mais longe nesse confronto, até um ponto sem recuo, arriscando-se a sucumbir à destruição mútua.

Dias atrás, numa reunião na casa do deputado Moreira Franco, em Brasília, pemedebistas e pefelistas retomaram o assunto da parceria de forma já não tão incipiente como havia sido feito anteriormente e marcaram um novo encontro cercado de sigilos e cuidados para não sair nada errado.

Os entendimentos avançam sustentados em dois pontos: a insatisfação do PFL com o modo tucano de fazer oposição e a convicção da direção, governadores e muitos diretórios do PMDB de que a candidatura de Anthony Garotinho cumpriu um papel até agora, conta com índices razoáveis nas pesquisas, mas não atenderá à demanda do eleitorado por um candidato de perfil mais composto, menos permeável a questionamentos no campo da boa conduta.

Está em andamento no PMDB uma operação rifa-Garotinho com o objetivo de derrotá-lo nas prévias do partido marcadas para o dia 5 de março de 2006.

Para isso, a preliminar óbvia é encontrar um oponente à altura, a tempo de "construir" uma relativa (absoluta é impossível) unidade do PMDB em torno de um nome palatável à opinião pública, aí considerando fortemente aquela mais bem informada, que acaba influindo na posição do eleitor mais distanciado dos debates políticos.

São três hoje as hipóteses postas à mesa, embora de maneira ainda fluida: os governadores do Rio Grande do Sul, Germano Rigotto, e de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, e o presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim.

Este último já foi mais bem avaliado internamente. Jobim acabou perdendo pontos naquilo que seria seu grande capital, o de se apresentar ao País como uma espécie de reserva moral, por causa das diversas polêmicas em que se envolveu na sua função de magistrado, sendo a mais recente a parcialidade e agressividade usadas para votar a favor da tese de defesa do deputado José Dirceu em ação no STF.

Além disso, Nelson Jobim reluta em deixar o Supremo antes de março, quando termina seu período na presidência, e assumir a candidatura logo para trabalhar pela indicação e se tornar um nome capaz de derrotar Garotinho. Ele prefere a unção sem disputas e isso o partido não quer aceitar, ainda mais agora, com os recentes danos de imagem. "O Jobim tem errado muito", diz um dirigente.

Dois integrantes da direção do PMDB tinham ontem à noite um encontro marcado com o governador Germano Rigotto, em São Paulo, para saber de sua disposição de enfrentar a parada, um desafio semelhante - em maior escala - ao enfrentado por ele quando, a partir de 2% nas pesquisas, ganhou de Antônio Britto e Olívio Dutra, os favoritos com 40% cada um, na eleição de 2002 no Rio Grande do Sul.

As sondagens preliminares ao governador de Pernambuco, Jarbas Vasconcelos, já foram feitas e uma conversa mais definitiva com ele deve ocorrer dentro de 15 dias.

Penas para o ar

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, não está a passeio na briga pela indicação do PSDB para a vaga de candidato a presidente da República.

No encontro que teve semana passada com Anthony Garotinho disse textualmente que vai "atropelar" José Serra porque se sente "atropelado" por ele.