Título: Ajuste volta a debate. 'Aprofundado'
Autor: Ribamar Oliveira e Adriana Fernandes
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/10/2005, Economia & Negócios, p. B4

O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, admitiu ontem que o programa de ajuste fiscal de longo prazo sofreu muitas críticas na reunião da Câmara de Política Econômica, realizada na última quarta-feira. "As discussões foram acaloradas", disse. Mas, segundo Bernardo, ninguém esperava que o plano não sofresse críticas. "É normal que as pessoas questionem um programa dessa natureza e que levantem dúvidas. Tem que ter polêmica mesmo", afirmou. Por causa dos questionamentos, o ministro informou que vai aprofundar os estudos sobre a proposta. "Eu reconheci (durante a reunião) que é preciso fazer um modelo mais aprofundado", acrescentou. Bernardo disse que acolheu uma sugestão feita pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para que a equipe econômica mostre como o programa de ajuste fiscal de longo prazo vai afetar favoravelmente a vida das pessoas e das empresas. "Ela disse que um plano como este precisa ser acompanhado de uma dose de esperança", relatou o ministro do Planejamento.

"Ela está certa. É preciso que fique claro o que vai acontecer com o emprego, com a renda das pessoas, com o crescimento da economia, com os investimentos, com as taxas de juros e com a dívida durante os 10 anos do programa", reconheceu. Para atender à preocupação de Dilma, a equipe econômica ficou encarregada de fazer simulações as repercussões do programa sobre todos esses aspectos econômicos e sociais. Uma nova reunião da Câmara será realizada dentro de três semanas.

O ministro atribuiu também as críticas de alguns ministros à idéia de que o programa prevê a elevação do superávit primário dos atuais 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB) para 5% do PIB. O superávit primário é a economia que o governo faz para pagar parte das despesas com os juros das dívidas. "Nós não apresentamos essa proposta de elevar o superávit durante a reunião", disse. "Não tem decisão se o superávit vai aumentar ou não. Não é essa a discussão".

"O superávit é acessório", reforçou o secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy. "A real questão é se queremos que a carga tributária baixe", afirmou o secretário, acrescentando que, para que a carga tributária caia, é preciso uma estratégia de médio e longo prazo para o ajuste fiscal." Ele informou, ainda, que uma orientação fiscal de longo prazo dará espaço para a economia brasileira crescer pelo menos 4% nos próximos 10 anos.

O programa apresentado na reunião, segundo Bernardo, prevê a fixação de um teto de 17,5% para as despesas correntes da União (que excluem os investimentos e os pagamentos dos juros), que cairiam 0,1% do PIB ao ano durante 10 anos. A alíquota da CPMF, que atualmente é de 0,38%, cairia para 0,08% em 2013. O mecanismo que permite o governo gastar livremente 20% de toda a arrecadação, e que é conhecido como Desvinculação das Receitas da União (DRU), seria elevado gradualmente para 35%.

Com a adoção desse programa, Bernardo estima que a dívida pública caia para 30% do PIB depois de 10 anos. Atualmente, a dívida corresponde a 51% do PIB. Segundo eleLevy, é ainda mais otimista e acha que a dívida poderá cair para 25% do PIB. A taxa de juro real (descontada a inflação) ficará, ao final do programa, em torno de 4% a 5% ao ano, segundo a projeção apresentada durante a reunião da Câmara de Política Econômica. Atualmente, o juro real está em torno de 13% ao ano.

Bernardo reconheceu a dificuldade de aprovar essa proposta no Congresso num ano eleitoral. "Não tenho dúvidas de que nós devemos ter dificuldades", afirmou. Mesmo assim, ele acha que existe espaço para essa discussão uma vez que a aprovação da proposta interessa a qualquer candidato à presidência da República. "Se colocarmos esse debate, mesmo que tenhamos o Congresso conflagrado pelas disputas eleitorais, como é normal e democrático, temos espaço para avançar", afirmou.