Título: O custo do contrabando
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Fonte: O Estado de São Paulo, 01/11/2005, Notas e Informações, p. A3

Contrabando e pirataria custam milhares de empregos perdidos anualmente no Brasil. Empresas desativam linhas de produção e desistem de investir no País, preferindo aplicar seu dinheiro em lugares mais seguros. Nos últimos três anos, 1.200 trabalhadores perderam o emprego com o fechamento de 31 fábricas de brinquedos. A produção de rádios e outros equipamentos portáteis de áudio foi abandonada, por decisão coletiva tomada pelas empresas no fim do ano passado. Essas empresas decidiram importar esse produto, mas nem isso estão conseguindo, porque não são capazes de concorrer com os contrabandistas, como informou o Estado, na edição de domingo, em reportagem assinada por Marcelo Rehder. Por muito tempo se discutiu o contrabando, no Brasil, como se fosse um jogo disputado por apenas duas equipes, a do Fisco e a dos infratores das normas alfandegárias. Os prejuízos para o País eram medidos pela sonegação fiscal. Manifestações de simpatia pelos contrabandistas não eram raras, como se fosse um mérito evitar a tributação e oferecer produtos mais baratos aos consumidores.

A tributação continua exorbitante e seus críticos estão mais certos do que nunca, mas hoje se vê com maior nitidez o estrago causado pelo contrabando e pela pirataria, isto é, pela falsificação e pela cópia ilegal de produtos de várias categorias. "Não há estatísticas, mas estimamos que, para cada emprego informal criado na pirataria, o País perde seis na economia formal", informa o diretor de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Roberto Giannetti da Fonseca.

Os números podem ser incertos, mas a gravidade dos problemas criados pelo contrabando e pela pirataria é visível na economia das empresas. A Dell Computadores e a Toshiba foram incapazes de enfrentar o contrabando. A Dell abandonou um plano de investimento no Brasil e construiu duas fábricas no exterior, uma na China, outra nos Estados Unidos, segundo a reportagem.

As empresas têm sugerido ao governo a redução de impostos sobre componentes importados. Com impostos mais baixos, o contrabando fica menos lucrativo e, ao mesmo tempo, indústrias em operação no Brasil podem reduzir custos, ganhar mais dinheiro e programar maiores investimentos no País.

Nada mais difícil, no entanto, do que obter do governo uma redução de impostos. Quando se trata de igualar condições de competição, as autoridades preferem aplicar mais um imposto às importações, sejam de produtos finais ou de componentes.

Contrabando e pirataria, no entanto, afetam interesses não só de empresas brasileiras, mas também de indústrias do exterior. Companhias norte-americanas queixam-se do florescente mercado de produtos pirateados no Brasil.

O governo dos Estados Unidos pressiona as autoridades brasileiras, cobrando maior empenho e resultados mais visíveis no combate à pirataria. As pressões incluem ameaças de retaliação comercial, como a exclusão do Brasil dos benefícios do Sistema Geral de Preferências.

As autoridades brasileiras têm ampliado e intensificado o combate ao contrabando e à pirataria, com maior cooperação entre a Receita, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária.

Esse esforço tem produzido resultados. De janeiro a setembro, o valor das mercadorias apreendidas em portos, aeroportos e fronteiras foi 30% maior que o de um ano antes.

Mas também é evidente a desproporção entre esse esforço e o tamanho dos problemas. Em São Paulo e noutras grandes cidades, o comércio de produtos contrabandeados e pirateados é ostensivo: é o ganha-pão de milhares de camelôs legais e principalmente ilegais. Esses vendedores são os elos mais visíveis das cadeias de um poderoso comércio ilegal.

São conhecidos, também, os vínculos entre o contrabando, a falsificação e o crime organizado. Há motivos de toda ordem, portanto, para um combate mais intenso e mais amplo dessas atividades. A Polícia e o Fisco, em todos os níveis de governo, devem realizar a maior parte da tarefa.

O combate será mais eficiente, no entanto, se envolver mais do que fiscalização e repressão. Uma tributação mais inteligente poderá tornar o contrabando menos lucrativo.