Título: Lula pede que PT reaja se oposição insistir em dinheiro vindo de Cuba
Autor: Vera Rosa e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 01/11/2005, Nacional, p. A4

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva orientou o PT a abrir o banco de dados abarrotado de denúncias contra a oposição, se tucanos e pefelistas mantiverem a tática do confronto com o governo. Em reunião da coordenação política, realizada ontem no Planalto, Lula recomendou aos petistas que nenhuma acusação contra o governo fique sem resposta. Agora, para rebater a reportagem desta semana da revista Veja, que acusa a campanha de Lula de ter recebido US$ 1,4 milhão ou US$ 3 milhões de Cuba, o PT ressuscitou o "Dossiê Cayman". À noite, da tribuna da Câmara, o líder do governo na Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), pôs em prática a estratégia acertada pela manhã no Planalto. Diante dos colegas de plenário que cobravam apuração rigorosa sobre o dinheiro cubano na campanha do PT, Chinaglia disse que, para o governo fazer uma investigação a respeito da remessa de dólares, seria necessário prova de que a acusação é verdadeira. "Sem provas, as ilações não passam disso mesmo: ilações", afirmou. Com esse argumento, o deputado insistiu em que todos os governos são vítimas do que chamou de "denuncismo".

"Por que o PSDB não pôs o Ministério Público e a Polícia Federal para investigar o Dossiê Cayman, na época em que surgiu ?", perguntou Chinaglia. A papelada que levou o nome de Cayman apareceu na campanha de 1998, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso concorria à reeleição. O dossiê que o pastor Caio Fábio tentou vender para o próprio Lula, que era candidato à sucessão de FHC, denunciava uma conta mantida nas Ilhas Cayman pelos tucanos Sérgio Motta e José Serra, então ministros das Comunicações e da Saúde, e por Mário Covas, na época governador de São Paulo. A PF abriu inquérito e identificou um grupo de estelionatários que confessou a farsa. Eles forjaram a documentação em Miami e estão sendo processados na Justiça Federal.

Na reunião, Lula citou esse episódio para lembrar que não aceitou o dossiê. A portas fechadas, disse que será preciso reagir com mais vigor se a oposição insistir em convocar o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, para explicar as denúncias na CPI dos Bingos. Segundo Veja, quem levou os dólares em caixas de bebida foi Vladimir Poleto, ex-auxiliar de Palocci na prefeitura de Ribeirão Preto.

"Só falta agora a oposição dizer que o PT recebeu dinheiro do Bin Laden", provocou Chinaglia.

A tarefa de defender o governo está a cargo do PT, que ontem também reuniu sua bancada na Câmara para avaliar a crise política. No Planalto, os interlocutores de Lula batem na tecla de que há um clima de denuncismo por causa da disputa eleitoral de 2006. "O que não podemos é ficar nesse clima de guerra fria, com essas escaramuças", observou o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner. "A CPI dos Bingos extrapola a função para a qual foi criada ao tratar dessa história de dinheiro de Cuba. A luta política não pode ser irracional e ninguém quer atear fogo no Congresso."

HERMAFRODITA

Com a mesma retórica do Planalto, o presidente do PT, deputado Ricardo Berzoini (SP), disse que a CPI perdeu o foco. Questionado sobre as investigações pedidas pelo PSDB e PFL, partiu para o ataque. "A oposição quer causar tumulto no processo, quer pôr lenha na fogueira", reagiu.

Os deputados petistas resolveram procurar os senadores do PT para calibrar o tom do discurso. Motivo: enquanto a bancada do partido na Câmara defende o embate com tucanos e pefelistas, a do Senado quer contemporizar.

"Esse clima de radicalização não leva a nada e só causa prejuízo ao País", notou o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). Para o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), Lula e o PT estão cada vez mais "enrolados". "É um governo hermafrodita: tem dois lados", ironizou, numa referência aos movimentos diferenciados do Planalto e do partido para enfrentar as denúncias de corrupção.