Título: Telhado de vidro
Autor: Dora Kramer
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/10/2005, Nacional, p. A6

O PT parte de novo para a ofensiva, convencido de que incêndio bom se apaga é com fogo Do PT pode-se dizer, e se diz, tudo. Mas de falta de atrevimento seria uma injustiça acusar o partido. Dono de um monumental telhado de vidro, o PT outra vez parte para cima dos adversários como se não tivesse mais contas a prestar e estivesse de novo na plena posse de suas faculdades morais e políticas.

Não faz concessões à prudência, não exibe vocação à autocrítica, não manifesta apreço pela paciência, se protege a poder de recuos estratégicos. Prefere não medir conseqüências, a despeito dos inúmeros tropeços sofridos exatamente em função da crença de que incêndio se combate com fogo.

É evidente que não se pode exigir, em nome da eficácia do lema segundo o qual passarinho na muda não pia, que o PT fique eternamente acuado sem reagir a ataques da oposição.

Mas seria de se esperar que gente que faz da política seu ofício e profissão tivesse algum entendimento mais preciso a respeito de tempos, modos e circunstâncias.

Vejamos, só para exemplificar com um caso de somenos importância no cômputo geral da crise, se era hora de o presidente do PT e possivelmente o futuro coordenador na campanha do presidente Luiz Inácio da Silva à reeleição, avalizar a folia malfazeja de correligionários na exibição de cartazes com a montagem da figura do presidente do PFL, Jorge Bornhausen, em uniforme nazista.

Berzoini não só evitou condenar a falta de noção de limites dos sindicalistas autores da tola reação a uma exorbitância verbal - "com a crise, vamos ficar 30 anos livres dessa raça" - do senador Bornhausen, como achou a fotomontagem um retrato fiel do "conservadorismo" representado pelo PFL.

Ora, se conservador é sinônimo de nazista, ao PT cumpriria ao menos repudiar os seguidores de Adolf Hitler abrigados nos partidos ditos conservadores que apoiaram Lula na eleição e integraram sua chapa e sua base parlamentar.

Um deles, o senador Antonio Carlos Magalhães, criticado por Ricardo Berzoini na tentativa de firmar um contraponto moral entre PFL e PT, até outro dia, quando ainda integrava a ala governista do PFL, era muito bem recebido e amplamente reverenciado nas hostes petistas.

Segundo Berzoini, seu partido nunca teve em seus quadros "traficantes, assassinos ou pessoas que promovem esquemas de grampo ilegal".

Não foi essa posição que o PT adotou quando concordou, junto com o PSDB, o PMDB e mais alguns outros partidos no Senado, em amaciar a condenação política a ACM quando o senador foi apontado como o responsável por um esquema de grampos ilegais montado na Secretaria de Segurança Pública da Bahia.

Quanto a assassinatos - Berzoini referia-se aos cometidos pelo deputado cassado Hildebrando Paschoal -, conviria ao PT deixar para tocar no assunto depois de ficar bem esclarecido que o partido não tem nenhum interesse em proteger os acusados de terem ordenado o seqüestro e a morte do prefeito de Santo André, Celso Daniel.

Estes e também os ataques relativos ao uso generalizado do caixa 2 são tão fáceis de serem rebatidos pela oposição que custa a crer que façam parte de um plano de reação pesado e medido por quem, além do desejo de recuperar terreno para ganhar a eleição, ainda tem a tarefa de sustentar um governo por mais um ano e dois meses.

Nessa condição, fica muito mais vulnerável que o adversário, cuja única preocupação nesse período é a de conquistar a simpatia do eleitorado. Não precisa administrar as adversidades de modo a não perder sustentação política nem densidade administrativa. Em resumo, quem precisa de paz para trabalhar é o governo, não a oposição.

Dessa forma, o acirramento proposto pelo PT - e obviamente de bom grado aceito pelo inimigo -, ainda mais numa situação de flancos abertos para todos os lados, não lhe favorece. Ao contrário, só amplia a área de desproteção.

Bumerangue

Com seus repetidos recursos ao Supremo Tribunal Federal, José Dirceu cumpre o roteiro por ele anunciado e tenta alimentar o mito do guerreiro sem quartel.

Na prática, porém, tem conseguido colecionar derrotas políticas que não ajudam a sustentar a versão do martírio ideológico. Como a Câmara tem cumprido todas as determinações do STF, o julgamento parlamentar vai ganhando amparo judicial.

João sem braço

Foi nenhuma a repercussão, dentro e fora do PT, da proposta feita semana passada pelos 12 senadores petistas de formalização de um compromisso de uso exclusivo de recursos legais e publicação diária na internet das despesas de campanha de todos os candidatos do partido.

Nem os autores da sugestão falaram mais no assunto. O restante das excelências de outros partidos também fingiu que não ouviu. Donde se conclui: a indignação geral com o uso de caixa 2 é propaganda enganosa.

Pinta e borda

A ex-mulher do ex-deputado Valdemar Costa Neto, Maria Cristina Mendes Caldeira, costumava pintar o sete nas acusações ao ex-marido; agora contenta-se em bordar.