Título: Líder agita, mas poder de causar danos é limitado
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Fonte: O Estado de São Paulo, 29/10/2005, Internacional, p. A29

Mahmud Ahmedinejad, o jovem presidente iraniano, assusta a Europa e o Oriente Médio com sua exigência de que Israel seja varrido da face da Terra. Mas mesmo se a observação fosse mais do que mera retórica, o poder de Ahmedinejad de perseguir uma política de confronto é fortemente limitado. O verdadeiro poder na república islâmica não é da presidência, mas do líder espiritual supremo, o aiatolá Ali Khamenei. O fundamentalista Ahmedinejad é um protegido do aiatolá, que o apoiou na eleição em que derrotou os candidatos reformistas. E o líder supremo, não eleito, tem, com os mulás do Conselho de Guardiães, a última palavra nas grandes questões de Estado. Ahmadinejad está em minoria até entre os conservadores. Segundo Ray Takeyh, do Conselho de Relações Exteriores, baseado nos EUA, surgiu durante a presidência de Muhamad Khatami o consenso de que o Irã pós-revolucionário não poderia mais viver num isolamento global do tipo que a a gafe desta semana provoca.

Khamenei fez o possível para minar as modestas reformas políticas de Khatami. Ele não admitia uma reaproximação com o Grande Satã (os EUA). Mas encorajou o estabelecimento de relações em todos os lugares.

"Ao cultivar relações favoráveis com parceiros internacionais importantes como a China, Rússia e União Européia, o Irã procurou montar uma coalizão de apoio própria para impedir os EUA de disseminarem uma abordagem coercitiva contra o Irã", escreveu Takeyh. "Embora a república islâmica continue dando seu apoio inflamado a organizações terroristas que combatem Israel e continue insistindo com o programa nuclear, sua política externa não é mais a de um Estado revolucionário. Esta perspectiva vai sobreviver à mais recente transição de liderança do Irã."

Ahmedinejad, filho de um ferreiro, ex-guarda revolucionário e ex-prefeito de Teerã, baseou seu apelo aos eleitores em justiça social e humildade pessoal. Sua exigência de uma "segunda revolução" atraiu críticas das corruptas elites religiosa e secular que controlam a maior parte da economia iraniana baseada no petróleo. Ele quase não tem experiência em relações exteriores. Seu comparecimento na ONU no mês passado, quando denunciou o "apartheid nuclear" do Ocidente, foi considerada um desastre diplomático.

E ele tem fama de ser teimoso. Uma de suas primeiras ações foi indicar um colega linha-dura, Ali Larijani, como chefe da equipe de negociação nuclear. E, em suposto desafio a Khamenei, Ahmedinejad teria procurado aconselhamento em Qom com o aiatolá Mohammed-Taghi Mesbah-Yazdi, "pai espiritual" antiocidental dos fundamentalistas.

Mas o presidente enfrenta novas restrições. Seu rival derrotado, Akbar Hashemi Rafsanjani, continua a presidir o influente Conselho de Expediente. O conselho ganhou mais poderes para supervisionar todos os ramos da estrutura de governo do Irã. E houve discussões sobre indicações de gabinete e o controle do Ministério do Petróleo. Há sugestões insidiosas de que esteja perdendo o controle. Tudo isso pode explicar sua aparente necessidade de adotar posições ousadas. Mas os espetaculares objetivos internacionais e as fracas performances internas sugerem que ele possa se tornar um problema para seus tutores de turbantes.