Título: Meirelles nega pressão por Valério
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2005, Nacional, p. A9

PARIS - O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, disse ontem que jamais sofreu qualquer pressão, do presidente da República ou do ministro da Fazenda, para atender a pedidos do empresário mineiro Marcos Valério Fernandes, em favor do Banco Rural. Meirelles reagia, assim, a uma notícia divulgada também ontem, pela revista Veja, segundo a qual Valério ¿ figura central no esquema de captação de dinheiro para o PT ¿ esteve pelo menos 17 vezes, nos anos de 2003 e 2004, no Banco Central, 5 delas na área de Fiscalização e de Liquidações. Esses encontros já haviam sido antes revelados ¿ mas seriam apenas 4. A reportagem de ontem, esclarecendo que ao todo foram 17, e os detalhes a respeito foram passados à revista pelo deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR), da CPI dos Correios. Nessas incursões, o empresário mineiro pretendia tratar de dois assuntos específicos. Primeiro, suspender a liquidação do Banco Econômico, que estava praticamente decidida. Segundo, encaminhar um pedido para que o Banco Mercantil de Pernambuco, também em liquidação, fosse comprado ¿ apenas a sua parte ¿não podre¿ ¿ pelo Banco Rural.

Se tudo desse certo, nos cálculos da revista, o prejuízo para os cofres públicos chegaria a R$ 1 bilhão. A operação, no entanto, teria sido abortada a partir de junho, quando, por obra do então deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), o nome de Valério foi associado às operações irregulares do PT.

¿Não recebi pressão do presidente, nem do ministro da Fazenda. O que de fato recebi sempre, em qualquer assunto, foi um apoio para tomar as decisões que o BC sempre julgasse adequadas. O presidente nunca falou comigo sobre esse assunto e nunca me senti pressionado em relação a essa questão¿, resumiu Meirelles. Ele participa, na Universidade Americana de Paris, do 10º Encontro Anual da Associação Econômica da América Latina e Caribe.

Meirelles reafirmou, também, que jamais conversou com o empresário mineiro. Quando as denúncias contra ele começaram a aparecer, garantiu em seguida, a decisão do BC ¿ contrária aos pedidos de Valério ¿ já havia sido tomada. O processo de liquidação dos dois bancos, acrescentou, foi discutido nas reuniões semanais que ele mantinha com o ministro Antonio Palocci, ¿como qualquer outro assunto relevante na esfera do Banco Central¿.

Ele negou também ter sofrido qualquer pressão da Casa Civil. ¿É muito importante que uma instituição demonstre seu compromisso irrestrito com a lei, sem qualquer exceção¿, disse. ¿Sinto orgulho disso, porque ninguém coloca em dúvida esse fato.¿ Para ele, o caso pode ser definido como a ¿crônica de um lobby mal sucedido¿. Importante, ressaltou, foi a decisão final tomada pelo BC, que negou os pedidos encaminhados por Valério. ¿Foi uma demonstração inequívoca do compromisso do BC com a lei. Ele foi inflexível.¿

VISITAS

Meirelles disse ter sido informado por diretores do BC sobre as visitas de Valério logo após o nome do publicitário começar a aparecer na imprensa. ¿Fui informado de que esse senhor que está nessas notícias esteve no BC representando essa instituição (Rural), muitas vezes acompanhado de diretores dessa instituição¿, afirmou. ¿A decisão do BC sobre o caso já havia sido tomada e julguei o assunto encerrado.¿

Ele soube que o total de visitas foi de 17 (e não 4) apenas na sexta-feira. ¿Tenho que analisar isso com mais cuidado.¿ Meirelles pretende coletar mais detalhes sobre o assunto. Mas comentou: ¿Não me parece um número excessivo de visitas, ao se tratar de um representante de um banco que tinha assuntos pendentes com o BC.¿

O presidente do BC lembrou que isso é uma prática comum entre representantes de outros bancos privados. ¿O fato de quantas vezes uma pessoa foi ao BC para tentar conseguir algo não é o mais importante¿, ponderou. ¿O importante é o seguinte: ele pode ter falado com diversos níveis do BC, várias vezes, mas nunca falou comigo. Segundo: o pedido não foi atendido. O BC agiu dentro da lei e, se houve tentativas, não foram bem-sucedidas.¿ O número de visitas, sugeriu, pode ser explicado ¿talvez porque ele seja muito insistente, ou estivesse tentando resolver por diversas pessoas¿.