Título: China quer multiplicar cérebros
Autor: Howard W. French
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/10/2005, Vida&, p. A27

XANGAI - Quando Andrew Chi-chih Yao, um professor de Princeton que é reconhecido como um dos maiores cientistas de computadores dos Estados Unidos, foi convidado pela Universidade Qinghua, de Pequim, no ano passado, para dirigir um programa avançado de estudos de computação, não hesitou. Pouco lhe importou trocar uma das principais universidades americanas por uma pouco conhecida fora da China. Ou o fato de que, depois de seu nascimento em Xangai, ele foi criado em Taiwan e passou toda sua carreira acadêmica nos Estados Unidos. Ele sentiu que poderia contribuir com sua pátria em acelerada ascensão.

¿Patriotismo tem algo a ver com isso, porque eu simplesmente não consigo me imaginar indo para outro lugar, mesmo que as condições sejam iguais¿, disse Yao, de 58 anos.

A China quer transformar suas principais universidades nas melhores do mundo em uma década e está gastando bilhões de dólares para atrair grandes cientistas acadêmicos como Yao e construir laboratórios de pesquisa de primeira linha. O esforço é a mais recente aposta da China para melhorar seu perfil como grande potência mundial.

RÁPIDA EXPANSÃO

A China já conseguiu uma das mais notáveis expansões da educação dos tempos modernos, aumentando em dez vezes o número de estudantes universitários e de pessoas com doutorado: em apenas uma geração, a proporção da população chinesa em idade universitária, que era de 1,4% em 1978, aumentou para cerca de 20%. Só em engenharia, a China está produzindo 442 mil novos graduados por ano, além de 48 mil mestres e 8 mil doutores.

¿As universidades de primeira classe refletem cada vez mais o poder geral de uma nação¿, disse o vice-primeiro-ministro Wu Bangguo, num discurso para comemorar os cem anos da Fudan, a primeira universidade moderna do país.

O modelo da China é simples: recrutar altos especialistas chineses e sino-americanos educados no exterior, instalá-los em laboratórios bem equipados, rodeá-los com os alunos mais brilhantes e dar-lhes extrema liberdade. Numa minoria de casos, eles recebem remunerações no padrão americano; em outros, são atraídos pelo custo de vida, as moradias generosas e os laboratórios. Não está claro quantos já se mudaram.

A China tem se concentrado em ciência e tecnologia, áreas que refletem as necessidades de desenvolvimento do país, mas também as preferências de um sistema autoritário que restringe a liberdade de expressão. As artes liberais geralmente envolvem um pensamento crítico sobre a política, a economia e a história e o governo chinês, que limita estritamente o debate público, dá uma ênfase relativamente pequena para alcançar status internacional nesses âmbitos.

Na verdade, os chineses dizem ¿ em geral eufemística e indiretamente ¿ que essas restrições ao debate acadêmico obstruiriam os esforços para criar universidades de padrão internacional.

¿Neste momento, não creio que alguma universidade na China tenha uma atmosfera comparável à das mais antigas universidades do Ocidente ¿ Harvard ou Oxford ¿ em termos de liberdade de expressão¿, disse Lin Jianhua, o vice-presidente executivo da Universidade de Pequim. ¿Estamos tentando oferecer aos alunos um ambiente melhor, mas para isso precisamos de tempo. Não dez anos, mas uma ou duas gerações, talvez.¿

Contudo, uma nova confiança sobre a entrada na elite educacional mundial é ouvida entre políticos e dirigentes universitários, alunos e professores. Enquanto isso, jovens chineses visitam os principais campus do país como que em peregrinação, posando para fotos diante dos grandes portões com arcos de pedra, por onde sonham entrar como alunos algum dia.