Título: Impasses podem esvaziar declaração final da cúpula
Autor: Gabriella Dorlhiac e Eduardo Salgado
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/11/2005, Nacional, p. A6

Os negociadores dos 34 países que fazem parte da Organização dos Estados Americanos (OEA) estão correndo contra o relógio para encontrar um consenso para o texto da declaração final dos presidentes que participarão sexta-feira e sábado da 4ª Cúpula das Américas, no balneário argentino de Mar del Plata. Os negociadores, aos quais somaram-se representantes plenipotenciários ontem, estão tropeçando em alguns pontos de conflito. Os que causam mais divergência são a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), as modalidades do combate à pobreza e a flexibilização das leis trabalhistas. Diplomatas e analistas consideram que o impasse tende a perdurar, motivo pelo qual a declaração final da cúpula seria "desbotada": sem compromissos relevantes ou cronogramas rigorosos, mas suficientemente "aceitável" para que todos os presidentes a assinassem.

A maior divergência é sobre a Alca. Para contorná-la, os negociadores formaram um grupo especial, de "competitividade comercial", que até ontem não chegara a um consenso. Os Estados Unidos querem que os países do continente se comprometam a retomar as negociações da Alca até abril. Mas, os integrantes do Mercosul e a Venezuela não desejam um compromisso tão definido.

Na questão da pobreza, a forma como o problema deve ser citado na declaração é que causa problemas. O governo dos EUA pretende incluir um parágrafo no qual os países se comprometem a reduzir a pobreza em 50% até 2015, além de destacar que os esforços realizados pela América Latina e pelo Caribe para debelar esse problema não tiveram sucesso. Mas o governo da Venezuela insiste em que, se esse parágrafo for incluído, deveria ser acrescentada a frase "enquanto nos EUA existem 37 milhões de pobres".

Faltando um dia para o início da reunião de chanceleres e dois para a cúpula presidencial, o clima das negociações está ficando tenso. Segundo informações extra-oficiais divulgadas ontem pelo jornal Clarín, o principal do país, os EUA pressionam o governo da Argentina, oferecendo ajuda nas suas negociações com o Fundo Monetário Internacional (FMI) em troca de um texto favorável à Alca no encerramento da cúpula.

O Clarín acrescenta que o governo de George W. Bush também pretenderia que o governo do presidente Néstor Kirchner se afaste do venezuelano, Hugo Chávez, com o qual tem uma estreita relação política e crescente intercâmbio comercial.

TRENS

Ontem, centenas de passageiros da linha de trem Sarmiento, furiosos com os atrasos constantes, incendiaram 15 vagões e a estação de Haedo, na Grande Buenos Aires. Em seguida, moradores dos empobrecidos bairros da região saquearam lojas e atiraram pedras em estabelecimentos próximos à estação, entre eles uma filial do Banco Itaú. A polícia deteve 87 pessoas.

O ministro do Interior, Aníbal Fernández, alegou que, por mais irritados que estivessem, moradores não promoveriam os distúrbios e atribuiu a depredação a grupos de esquerda. Nos últimos dias o serviço ferroviário piorou muito, pois vários trens foram desviados para levar forças de segurança e equipamentos para Mar del Plata.