Título: O sucesso de Chávez
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Fonte: O Estado de São Paulo, 04/11/2005, Notas e Informações, p. A3

O Movimento Quinta República (MVR), partido do presidente Hugo Chávez, prevê que, nas eleições de 4 de dezembro, obterá 134 das 167 cadeiras da Assembléia Nacional. Atualmente, o MVR tem 69 deputados que, somados a 17 dos partidos aliados, fazem uma bancada chavista de 86 parlamentares, contra 79 da oposição. Essas projeções, se confirmadas, consagrariam Hugo Chávez como um campeão de eleições. Desde que foi eleito, já venceu nove pleitos, inclusive o referendo convocado para decidir sobre sua permanência no governo. Chávez tem, de fato, grande prestígio popular, principalmente entre as camadas mais pobres da população. Trata-se de um paradoxo, uma vez que, durante o seu governo, não só aumentou a pobreza, na Venezuela, como os pobres estão ficando muito mais pobres.

O antigo líder golpista prova que um governo desastroso do ponto de vista das liberdades públicas e da economia nacional pode ser eleitoralmente rentável. O diretor de organização de seu partido, William Lara, dá a receita para parte do sucesso eleitoral que espera obter: uma "campanha casa a casa, porta a porta", que será feita pelas Unidades de Batalha Eleitoral. Como os Círculos Bolivarianos - que se encarregam de manter a fidelidade a Chávez nos bairros -, as Unidades de Batalha Eleitoral são organizações estruturadas nos moldes das milícias fascistas. Se não convencem, coagem.

A outra parte da receita é um programa assistencialista, que consome boa parte das receitas do petróleo. Essa mistura de truculência com assistencialismo está produzindo uma degradação social sem precedentes na Venezuela, que contrasta fortemente com a riqueza cada vez maior proporcionada pelo petróleo.

Segundo pesquisa feita pelo Instituto Nacional de Estatísticas (INE), órgão oficial do governo venezuelano, a pobreza cresceu 10 pontos porcentuais nos cinco primeiros anos da administração Chávez, passando de 43% da população, em 1999, para 53%, em 2004. A Cepal constatou que a pobreza extrema passou de 15% da população para 23%, em dez anos. E, no mesmo período, a subnutrição saltou de 11% para 17%. Pela última medição do Índice de Desenvolvimento Humano feita pela ONU, a Venezuela foi rebaixada do 68º lugar para o 75º, em um ano. Os economistas da ONU também verificaram que, nos últimos dois anos, a renda per capita caiu de US$ 5.380 para US$ 4.900.

O mais escandaloso é que essa debacle ocorreu num período em que os preços internacionais do petróleo - produto do qual a Venezuela tira 80% de sua renda - tiveram um aumento estratosférico. Quando Chávez foi eleito, no final de 1998, o barril custava pouco mais de US$ 8. Na sua posse, em 1999, o barril estava cotado a cerca de US$ 10,50. Atualmente, a Venezuela vende seu produto a US$ 62 o barril. Graças a essa tendência altista, a Venezuela pôde sair sem maiores traumas da crise fiscal em que se encontrava no final da década de 1990 e que praticamente exaurira suas reservas. Em 2003, o país tinha acumulado reservas internacionais da ordem de US$ 15 bilhões. Essas reservas, que eram de US$ 24 bilhões no começo deste ano, já atingiram US$ 31 bilhões.

O que Chávez faz com a riqueza do petróleo? Além do que gasta com programas sociais que não reduzem a pobreza, Chávez tem comprado armas para equipar, não as Forças Armadas, mas as milícias populares, preparando-as para resistir a uma invasão da Venezuela pelos Estados Unidos - argumento fantasioso que usa para atrair apoio popular. Financia grupos revolucionários - em nome da Revolução Bolivariana, seja lá o que isso signifique - na Bolívia, Peru e Nicarágua. Financia os seus sonhos de liderança continental - como acaba de fazer com copiosa ajuda concedida à Argentina, sob a forma de fornecimento subsidiado de petróleo e compra de bônus em valor que já ultrapassa US$ 600 milhões e pode chegar a US$ 1 bilhão.

E desenvolve o tal programa para acabar com a pobreza na Venezuela, e que não passa de farta distribuição mensal de dinheiro vivo para os pobres e de alimentos subsidiados para os trabalhadores. Esse assistencialismo não acaba com a pobreza; antes a perpetua. Mas mantém a grande população pobre da Venezuela presa a essas benesses. É assim que mantém cativo o seu eleitorado.