Título: Lula ordena fim do fogo amigo para segurar Palocci no cargo
Autor: Vera Rosa
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/11/2005, Nacional, p. A4

Às vésperas de comparecer ao Congresso para prestar esclarecimentos, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, viu sua situação agravar-se ontem. Além de voltar a sofrer ataques de governistas e oposicionistas, Palocci ficou ainda mais vulnerável com os depoimentos à CPI dos Bingos de Rogério Buratti e Vladimir Poleto, seus ex-auxiliares na prefeitura de Ribeirão Preto. Em meio à crise política, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou em campo e comandou uma operação para segurar Palocci no cargo. O ministro enfrenta o momento de maior desgaste desde o início do governo. Sua permanência na equipe depende do desfecho das investigações que o jogaram no centro da crise depois de sucessivas denúncias de corrupção. Sem a blindagem que o protegia das acusações, Palocci chegou a dizer a Lula que, se tiver de prestar depoimento em uma CPI, deixará o ministério.

O presidente não aceita essa hipótese. Numa negociação de bastidor, o governo acertou que Palocci comparecerá apenas à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, no dia 22. Além disso, Lula prometeu a Palocci que fará uma declaração pública de apoio incondicional à política econômica.

Na tentativa de conter o fogo amigo para baixar a temperatura da crise, o presidente também pediu à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, que não faça mais críticas ao ajuste fiscal de longo prazo e ao aumento do superávit primário.

A ordem de Lula é para que tanto Dilma como Palocci parem com a guerra. "Já temos muitos problemas", afirmou o presidente. Em entrevista ao Estado, Dilma deu várias estocadas no plano de ajuste proposto pelo ministro do Planejamento, Paulo Bernardo. Chamou o plano de "rudimentar" e disse que esse debate é "absolutamente desqualificado". "Para a dívida pública não crescer, é preciso ter uma política de juros consistente, porque senão você enxuga gelo seco", comparou a ministra, provocando a ira de Palocci.

Sucessora de José Dirceu na Casa Civil, Dilma desculpou-se com Palocci e Bernardo, alegando que se expressou mal. Conhecida como dama de ferro, ela afirmou que, quando falou em "rudimentar", quis dizer "incipiente". Mas o estrago já estava feito. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), tentou pôr panos quentes nas divergências. "Não há nenhum tipo de briga. Há um diálogo e uma disputa sobre concepções, como ocorre em todos os governos", amenizou. "Mas há situações em que esse debate ganha conotação inoportuna, como agora, em que Palocci sofre ataque frontal. O momento é muito delicado."

A preocupação no Planalto é evitar que a crise alimente a boataria sobre mudanças nos rumos econômicos. O governo teme, ainda, que cole em Palocci a imagem de "arrecadador" de campanha. "Não vamos enveredar pelo caminho da gastança populista", garantiu Mercadante, após reunião na Granja do Torto com Lula. "O que a oposição quer é antecipar o calendário eleitoral."

Para o prefeito de Aracaju, Marcelo Déda (PT), está havendo tempestade em copo d'água. "É preciso calma nesse fiscalismo. A execução orçamentária anda a passo de cágado, enquanto as demandas sociais estão a pique de Ferrari. As opiniões de Dilma podem até ter causado confusão no governo, mas me livraram de um enfarte. Eu me senti contemplado", disse Déda.

À tarde, enquanto Buratti e Poleto depunham na CPI dos Bingos sobre a arrecadação ilegal de recursos para o PT, Palocci despachava no terceiro andar do Planalto - o mesmo do gabinete presidencial. Lula, porém, estava em Teófilo Otoni (MG). Depois, ele cancelou a viagem que faria hoje a Mucuri (BA) e São Mateus (ES) para tratar da crise política.

"Foi uma pancada muito forte no Palocci", comentou o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). "Agora, não sei se ele se levanta."