Título: Greves param INSS 5 dias por mês
Autor: Marcelo Rehder
Fonte: O Estado de São Paulo, 14/11/2005, Economia & Negócios, p. B1

Desde o início do governo Lula, os funcionários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e médicos credenciados pelo órgão já acumulam 191 dias de greves e paralisações , o que corresponde a mais de seis meses de paralisia, de acordo com dados da Federação Nacional dos Sindicatos de Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social (Fenasps). É como se a cada mês eles ficassem sem trabalhar durante cinco dias úteis. Os maiores prejudicados são os beneficiários do sistema que deixam de ser atendidos. São aposentados, pensionistas, trabalhadores doentes, inválidos, viúvas e gestantes.

Não há estimativas seguras sobre os prejuízos financeiros com essas greves, mas estudo feito no ano passado pelo Ministério da Previdência Social dá uma idéia da dimensão dos estragos. Os técnicos chegaram à conclusão que um mês de filas nos postos do INSS significa uma perda de R$ 250 milhões com ineficiência dos serviços e atraso de perícias. Projetando esse valor para a greve dos servidores deste ano, que durou 75 dias e foi a terceira mais longa dos últimos 10 anos, o País teria perdido R$ 625 milhões.

"É um número assustador", diz o presidente da Associação Nacional dos Médicos Peritos (ANMP), Eduardo Henrique Rodrigues de Almeida. Entre os prejuízos, ele cita a manutenção do pagamento do auxílio-doença. O segurado que não conseguiu marcar ou fazer a perícia revisional por causa da greve, teve o benefício renovado automaticamente por mais três meses. É prejuízo porque o segurado poderia ter recebido alta e voltado a trabalhar, deixando de receber o benefício.

Em 2004, dos R$ 9,3 bilhões gastos com auxílios-doença, R$ 2,4 bilhões foram destinados à prorrogação do pagamento de benefícios sem a realização de perícia. Em 2005, essa despesa saltará para para R$ 3 bilhões, de um total previsto de R$ 10,5 bilhões para o pagamento de auxílios-doença, de acordo com estimativas preliminares da própria Previdência Social. Para eliminar o problema, foi criado o programa Data Certa, que prevê o dia certo de alta do segurado. Mas o programa só foi adotado no fim de agosto deste ano.

"Não tenho horror a este tipo de coisa chamada greve", diz Paulo Francini, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). "Mas é evidente que existe uma brutal diferença entre uma greve numa empresa privada, aonde fica muito nítido quem pleiteia direitos e quem está sendo ofendido, e outra num serviço público essencial que desrespeita um direito da sociedade. Não dá para aceitar que uma pessoa morra na fila do INSS por falta de atendimento".

A motivação dos servidores parece justa. Eles pedem aumento de salários. Na prática, porém, se aproveitam de uma brecha na legislação: a falta de regulamentação das greves no setor público. Desde que a Constituição de 1988 concedeu esse direito ao funcionalismo civil, nenhum governo enviou ao Congresso um projeto de lei disciplinando o seu exercício. Como 2006 é ano de eleições, os especialistas afirmam que o assunto deve permanecer ainda um bom tempo engavetado.

Não é por obra do acaso, que o setor público concentrou a maior parte das greves ocorridas em 2004, de acordo com levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socio-Econômicos (Dieese).

Do total de 302 greves, 61% foram feitas por funcionários públicos. Eles também foram campeões em horas paradas: 19 mil, ante 3 mil no setor privado.

Clemente Ganz Lúcio, diretor-técnico do Dieese, explica que as negociações salariais no setor público são mais difíceis por causa da falta de políticas apropriadas. Por esse motivo, as greves são mais longas. Mas há outros fatores. Um dos principais é que, no setor privado, os dias parados são descontados e o medo do desemprego é mais presente. Já os servidores públicos têm estabilidade.

"Os problemas do setor publico são bem maiores porque na década de 90 os salários do servidor foram violentamente arrochados. Houve tanto uma precarização das condições de trabalho e de salários quanto uma destruição das perspectivas profissionais no setor", diz o diretor do Dieese.

A regulamentação da greve no serviço público é defendida até mesmo pela Central Única dos Trabalhadores (CUT), que representa boa parte do funcionalismo. Dos 3,3 mil sindicatos filiados à central, 28% são ligados ao setor público.

Mas o presidente da central, João Felício, afasta qualquer possibilidade de acordo que retire o direito de o servidor cruzar os braços quando estiver descontente com a sua vida funcional e salarial. "Uma coisa é parar uma máquina. Outra é parar um serviço essencial à população, como um hospital ou o INSS. Tem de haver um atendimento de emergência. Mas acabar com o direito de greve é inaceitável, porque o cidadão tem de ter ao menos a possibilidade de espernear. A greve é uma forma de espernear". PARADOS

Desde o dia 25 de outubro, boa parte dos médicos peritos credenciados do Estado de São Paulo pararam de atender, gerando um acúmulo de cerca de 30 mil perícias, segundo a associação da categoria. Os 2.749 médicos credenciados em todo o País não recebem desde julho. A dívida do governo com eles é de R$ 33 milhões. Os médicos receberam em outubro pelos serviços prestados em junho. Colaborou: Paulo Pinheiro