Título: Afastamento deixa Palocci mais vulnerável
Autor: Paulo Sotero
Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2005, Economia & Negócios, p. B1

O afastamento do secretário do Tesouro, Joaquim Levy, que vai assumir a Gerência de Planejamento do BID, deixa mais vulnerável o ministro da Fazenda, Antonio Palocci. O homem de mãos de ferro na execução do Orçamento e do ajuste fiscal sai no momento em que crescem as pressões por novos gastos. Suceder Levy não será fácil, apesar de Palocci ainda contar com o secretário-executivo, Murilo Portugal, que durante anos, no governo passado, conduziu também com rigidez a liberação de gastos. Levy, conhecido como um trator no ministério, tem trânsito livre no Planalto. O presidente Lula costuma ligar diretamente para ele quando recebe queixas de ministros por causa de liberação de verbas. Além disso, Levy tem posição de destaque na equipe de Palocci porque participa e opina na condução da política econômica. No governo passado, essa função formuladora estava mais identificada com Banco Central (BC) e a secretaria de Política Econômica da Fazenda.

Ele foi um dos alvos principais do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu e da bancada do PT no Congresso, onde era visto quase como inimigo. As pressões foram tão fortes que a cabeça do secretário foi pedida ao presidente. Na disputa, Palocci bancou o secretário e chegou até a ameaçar deixar o cargo.

Nos últimos tempos, Levy chegou a enfrentar o presidente do BNDES, Guido Mantega, por causa da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), e a diretoria do BC. Como principal responsável pela administração da dívida pública - um montante de R$ 933,22 bilhões -, o secretário é um dos críticos da condução da Política Monetária. Acha que há vazamento dos chamados canais de transmissão na política monetária e a taxa Selic não podia atuar sozinha no combate à inflação.

Para ele, a TJLP, ao não acompanhar o movimento da Selic, é um desses "canais de vazamento" que reduzem a eficácia da política monetária. "Se a Selic sempre age sozinha, o Banco Central é obrigado a dobrar a dosagem dos juros para fazer com que a inflação convirja para a trajetória almejada", disse Levy, numa entrevista exclusiva ao Estado que inaugurou na imprensa o debate sobre a TJLP e levou Mantega ao contra-ataque.

Com o BC, acumulou desavenças ao reclamar das dificuldades de reduzir a dívida púbica por conta do impacto das elevadas taxas de juros. Também brigou com a diretoria do BC para trazer a administração da dívida externa para o Tesouro.

Defensor ferrenho de um ajuste fiscal mais profundo, Levy era um dos principais aliados do ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, no plano de garantir um programa fiscal de longo prazo. Obcecado pela queda da relação da dívida pública com o Produto Interno Bruto (PIB), ele via no plano a possibilidade de trazer a dívida para níveis mais saudáveis num prazo de tempo menor.

O secretário protagonizou embates nos bastidores também com as agências de classificação de risco. Contestava os critérios de atribuição das notas para o Brasil e considerava-os excessivamente subjetivos. Recentemente, brigou pela elevação da nota do País, que não mudava, apesar da melhora da economia.

No ministério, a surpresa parece grande, embora seja se deva considerar que o vazamento da notícia, em um dia em que Palocci está sob fogo cruzado, não devia estar nos planos da equipe econômica.