Título: Países pobres: fiquem firmes
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Fonte: O Estado de São Paulo, 12/11/2005, Economia & Negócios, p. B10

O ministro de Relações Exteriores brasileiro, Celso Amorim, foi direto depois da frustrada última rodada de negociações comerciais em Londres e Genebra esta semana. A menos que a União Européia pare de hesitar e corte os seus subsídios agrícolas para ajudar os fazendeiros dos países pobres, as negociações para a abertura do mercado de produtos manufaturados e serviços - que ajudam as grandes empresas da Europa e América - não levará "um mês, dois meses, um ano ou dois anos". As negociações, segundo ele, "simplesmente não irão progredir". Para Amorim, como para os outros negociadores dos países em desenvolvimento, que têm sido dominados pelo mundo rico nas negociações comerciais durante os últimos 50 anos, esse momento se resume a duas palavras: fiquem firmes. Não façam nem mesmo uma concessão adicional até que a União Européia corte os subsídios agrícolas. É melhor deixar as negociações frustrarem e mandar os poderosos para casa sem nada nas mãos do que se deixar enganar novamente pelas hipócritas tolices européias sobre o livre mercado quando, na verdade, seus países, liderados pela França, acreditam em livre mercado apenas quando serve a seus limitados interesses.

Nos últimos 50 anos, a Organização Mundial do Comércio e seu predecessor, o Acordo Geral de Mercados de Tarifas, desmantelaram agressivamente as barreiras contra o comércio de bens industriais e serviços, áreas nas quais os países ricos da Europa, juntamente com os Estados Unidos e Japão, têm ampla vantagem. Mas quando se trata de áreas nas quais os países pobres poderiam florescer, como têxteis e agricultura, a história é diferente.

O mundo desenvolvido destina aproximadamente US$ 1 bilhão em subsídios a fazendeiros, o que encoraja a superprodução e abaixa os preços. Os fazendeiros dos países pobres não podem competir com produtos subsidiados.

Há quatro anos, em Doha, no Catar, os países pobres receberam da Europa, Japão e Estados Unidos a promessa de acabar com esses subsídios, além de liberar o comércio mundial de serviços e produtos manufaturados.

Os Estados Unidos se adiantaram nas negociações e fizeram uma oferta substancial no mês passado, por meio de seu representante, Robert Portman: o país diminuirá em 60% os subsídios agrícolas se a Europa e o Japão cortarem os seus em 83%. Há uma diferença nos números porque os países europeus e o Japão têm subsídios maiores.

A Europa se recusou, com os franceses, como é normal, na liderança, e jurou bloquear qualquer acordo final que ultrapasse a anêmica oferta européia de cortes insignificantes. Então o comissário da União Européia no Comércio, Peter Mandelson, teve a coragem de pedir aos países pobres que cortem ainda mais os subsídios industriais e de serviços.

Se a União Européia realmente se recusar a corrigir 50 anos de subsídios distorcidos, o que ajuda os ricos à custa dos pobres, então há uma resposta simples. As negociações simplesmente não irão progredir.