Título: Menos feijão e ovo no prato brasileiro
Autor: Ricardo Westin
Fonte: O Estado de São Paulo, 11/10/2005, Vida&, p. A17

Segundo especialistas do Ministério da Saúde, 260 mil mortes poderiam ser evitadas por ano com alimentação adequada

Técnicos do Ministério da Saúde passaram três anos debruçados sobre praticamente todas as pesquisas realizadas no Brasil sobre alimentação. Diante da conclusão já esperada - os brasileiros estão comendo cada vez pior -, acabaram de elaborar o primeiro guia oficial do País sobre alimentação saudável. Até então, as autoridades federais, estaduais e municipais de saúde precisavam recorrer a referências estrangeiras, principalmente dos Estados Unidos, para orientar as políticas públicas ligadas à alimentação. Logo no início, o Guia Alimentar para a População Brasileira, que está na internet (www.saude.gov.br), esclarece que a mais típica combinação nacional - o arroz com feijão - é "saudável e completa em proteínas".

O feijão mostra como os hábitos alimentares têm piorado. Segundo os dados compilados pelo Ministério da Saúde, o consumo caiu 30% ao longo dos últimos 30 anos - em 1974-1975, o feijão representava mais de 8% do dinheiro que uma família gastava no supermercado; em 2002-2003, caiu para 5,68%. Também tiveram queda alimentos importantes, como ovos, cereais e verduras.

Seguindo a mesma tendência, produtos que precisam ser consumidos com moderação tiveram aumento. O consumo de refeições prontas, ricas em gordura, açúcar e sal, praticamente duplicou - nos anos 70, respondiam por 1,26% das compras no supermercado; nesta década, saltaram para 2,29%. O consumo de bebidas alcoólicas também dobrou. O de embutidos, como salsicha e mortadela, triplicou. E o de refrigerantes quadruplicou.

Outro problema para o qual o Guia Alimentar chama a atenção é o consumo exagerado de sal. Em 1975, o brasileiro consumia em média 8,5 gramas por dia. Em 2000, eram 15 gramas. O máximo recomendado são 5 gramas diários.

PREJUÍZOS E MORTES

Os alimentos que a população põe no prato começam a preocupar o governo porque os efeitos de uma dieta ruim têm se tornado um grande peso para os cofres públicos. Quase 70% de todos os gastos do Sistema Único de Saúde (SUS), ou R$ 11 bilhões, vão para o tratamento das doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade, diabete, hipertensão arterial, câncer e doenças do coração - problemas causados em parte por uma alimentação ruim. Segundo o Ministério da Saúde, sem contar o problema da desnutrição, 260 mil mortes poderiam ser evitadas a cada ano no País se a população comesse melhor.

"Quando perguntamos o que é uma alimentação saudável, as pessoas normalmente citam frutas, verduras e legumes. Elas sabem o que é. O problema é que não põem em prática. É por isso que o governo está incentivando o consumo de alimentos saudáveis", explica Ana Beatriz Vasconcellos, coordenadora da Política de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde.

Os primeiros 50 mil exemplares do Guia Alimentar estão sendo distribuídos aos profissionais da rede pública de saúde. Até o ano que vem, as 236 páginas serão resumidas e entregues à população de baixa renda em forma de cartilha, com exemplos concretos, sem termos às vezes incompreensíveis, como carboidrato e ácido graxo.

Entre as sugestões está comer uma porção de feijão para duas de arroz seguidas de suco de laranja, o que aumenta a absorção de ferro pelo organismo. Outra dica é prestar atenção à quantidade de óleo que se usa. Se uma família de quatro pessoas consome mais de uma lata por mês, é sinal de que o consumo de óleo está acima do ideal.