Título: Blair sofre derrota histórica
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Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2005, Internacional, p. A13

No primeiro revés do primeiro-ministro desde 1997, Câmara dos Comuns rejeita projeto de lei antiterrorista

O primeiro-ministro britânico, Tony Blair, sofreu ontem uma derrota histórica na Câmara dos Comuns, a primeira desde que o Partido Trabalhista assumiu o poder em 1997. Os deputados rejeitaram o principal artigo da lei antiterrorista que ampliava de 14 para 90 dias a prisão sem culpa formada de suspeitos de terrorismo, que Blair considerava o tempo ideal para a polícia levantar provas contra os detidos. A bancada trabalhista detém maioria absoluta no plenário, mas na votação de ontem 41 trabalhistas votaram contra o projeto de Blair, que acusou o Parlamento de ter agido de forma "profundamente irresponsável". "Espero que não lamentemos depois", ressaltou o primeiro-ministro.

A derrota compromete a autoridade de Blair, mas não significa que ele deva deixar o cargo ou antecipar a convocação de eleições gerais. Segundo um porta-voz do governo, o resultado da votação não representa um voto de censura para o chefe do governo. "O que estava em jogo era uma proposta da polícia, apoiada pelo governo", esclareceu.

O primeiro-ministro não reconhece nem que tenha se equivocado. "Às vezes é melhor perder fazendo o certo do que vencer com algo errado", disse ele sobre o projeto duramente criticado pelas associações de defesa dos direitos civis.

Pouco antes da votação, Blair havia sido submetido a uma sabatina no plenário pelos deputados. "Vocês têm o dever de apoiar a polícia", advertiu. A polícia, insistiu, precisa estar habilitada a prender suspeitos antes que eles ajam, ferindo ou matando em massa."Não vivemos num estado policial, mas num país que se encontra diante de uma séria ameaça terrorista", alertou. Para reforçar seus argumentos e obter o apoio da maioria, Blair revelou que a Scotland Yard frustrou dois grandes ataques terroristas desde os atentados de 7 de julho em Londres, que deixaram 56 mortos.

O líder conservador Michael Howard não se deixou impressionar pela retórica do chefe do governo. Ele desafiou Blair a apresentar um exemplo de caso que tenha exigido 90 dias para colher evidências contra um suspeito. Não obteve resposta.

O plenário julgou exagerado o apelo de Blair e apenas dobrou o período atual de 14 de detenção para 28 dias .

O deputado Charles Kennedy, líder do Partido Liberal Democrata (terceira força política do país), previu a derrota do artigo da lei também na Câmara dos Lordes. Ali, ressaltou ele, essa medida é classificada de "intolerável".

O deputado Jeremy Corby, um dissidente trabalhista, também não deixou por menos. "O governo vive um grande pânico", afirmou ele - um dos colegas de Blair que votaram contra a medida.