Título: Na disputa pelo controle da internet, todos cantam vitória
Autor: Otávio Dias
Fonte: O Estado de São Paulo, 17/11/2005, Economia & Negócios, p. B6

Os Estados Unidos cantaram vitória; os países que pressionavam por uma internacionalização da gestão da internet, entre eles o Brasil, também. Assim começou a Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação, ontem, em Túnis. Na noite de terça-feira, mais de cem países chegaram a um acordo sobre a polêmica questão do controle da internet. Os EUA mantiveram o controle sobre os aspectos técnicos da administração da rede mundial de computadores, preservando o cerne de sua função atual.

Foi criado, no entanto, o Fórum de Governança da Internet, do qual participarão governos e representantes de empresas e da sociedade civil. O fórum não terá poder decisório em questões relativas à administração da Web, mas articulará políticas em áreas importantes como segurança no ciberespaço (combate a spams, vírus etc.), políticas de inclusão digital e regras mais claras para o comércio online internacional, entre outras.

Como muitas ações importantes para o funcionamento da rede dependem de ações de governos, empresas e entidades civis, há espaço para a obtenção de resultados concretos. Não há hoje um fórum único para discutir os complexos temas surgidos com o crescimento da internet e das novas tecnologias digitais. Mas a gestão de domínios e de endereços da internet, assim como a administração dos computadores centrais responsáveis pelo funcionamento da rede, permanecerão sob responsabilidade da Icann (Internet Corporation of Assigned Names and Numbers), sediada na Califórnia.

A Icann é uma organização privada, sem fins lucrativos e 'quase independente', à qual o governo americano delegou a gestão da rede. O órgão manterá seu poder de decisão sobre os aspectos técnicos da administração da internet. 'Não mudamos nada no que diz respeito ao papel do governo americano e aos aspectos técnicos que tanto nos preocupavam', disse o embaixador David Gross, chefe da delegação americana na cúpula.

Mas outros participantes têm outra visão. Para a União Européia, que foi o fiel da balança na decisão de criar o fórum, haverá 'uma internacionalização maior na governança da internet e uma maior cooperação'.

O documento, que deverá ser aprovado no final da cúpula amanhã, prevê que cada país seja ouvido em decisões que a Icann venha a tomar relativas ao seu domínio. Por exemplo: o Brasil participará de decisões sobre o domínio '.br'.

Já o embaixador Antonino Marques Porto, representante do Brasil nas negociações, acredita que o fórum terá influência e acabará sendo ouvido pelos EUA. 'Foi criado um fórum multilateral e internacional, que poderá discutir e estabelecer políticas muito mais transparentes em relação à internet', disse ao Estado.

Ele avaliou o acordo como uma vitória dos países que defende a internacionalização do controle da internet. O Brasil é um dos líderes do grupo, do qual participam outras nações em desenvolvimento.

A UE mudou de posição recentemente e passou a apoiar a criação de um novo organismo, o que teve um peso fundamental na conclusão do acordo.

O primeiro encontro do Fórum de Governança da Internet será em 2006. 'Viramos uma nova página na história da internet nesta conferência', disse o secretário-geral da cúpula, Yoshio Utsumi. Já o secretário-geral da ONU, Kofi Annan, na sessão de abertura da conferência, ontem, buscou um apaziguamento com os EUA: 'Quero deixar bem claro que a ONU não quer assumir funções, policiar ou controlar a internet.

A gestão diária da rede deve ser deixada para instituições técnicas. Foi criado um órgão que discutirá questões e terá sua voz ouvida. É um bom início de cooperação. Por terem criado a internet e investido em sua infraestrutura, os EUA dizem que têm o direito a manter o controle.