Título: Senado é o desafio da Super-Receita
Autor: Sérgio Gobetti
Fonte: O Estado de São Paulo, 10/11/2005, Economia & Negócios, p. B3

Já aprovada pelos deputados, a MP 258 teria de receber aval também pelos senadores, sem alterações, ainda esta semana

Após dois dias de sessões, a Câmara dos Deputados finalmente concluiu ontem a aprovação da Medida Provisória 258, que cria a Super-Receita, uma megaestrutura para aumentar a arrecadação do governo federal. Sabendo das dificuldades para aprovar até o dia 18 o texto no Senado, onde a oposição é majoritária, o governo já sinaliza com a reedição de um programa de reparcelamento das dívidas tributárias do setor privado, a exemplo do que fez em relação a Estados e municípios devedores do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Apesar do aceno do líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), em sintonia com uma reivindicação de igual teor da Confederação Nacional das Indústrias (CNI), a oposição manteve a ameaça de obstruir a votação da MP, que unifica a Receita Federal com a Receita Previdenciária. "O mérito é questionável, e a admissibilidade, muito mais. Esse não era um assunto para ser tratado por medida provisória", criticou o líder do PFL no Senado, José Agripino Maia (RN).

Segundo ele, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, já foi advertido de que a oposição tentará derrubar a MP no Senado como querem os sindicatos de servidores públicos. Justamente por isso, a equipe econômica começou a testar ontem a receptividade à proposta de reparcelamento das dívidas tributárias do setor privado. O problema da proposta é que, se incluída na MP, poderia ajudar na obtenção de apoio dos senadores, mas exigiria também uma nova rodada de votações na Câmara, já que a inclusão implicaria alteração no texto.

Como o prazo para a MP ser convertida em lei acaba no dia 18, restam três dias úteis - e em meio a uma semana de feriado - para os parlamentares salvarem mais uma MP editada pelo governo. Na prática, as estruturas de arrecadação da Previdência e da Receita Federal já estão funcionando de maneira coordenada desde meados de julho, e uma eventual derrubada da MP obrigaria o governo a desfazer tudo que já fez.

O texto aprovado ontem na Câmara também garante aos Estados o reparcelamento de seus débitos com o INSS em 240 meses. No final da votação, os termos do refinanciamento ficaram idênticos aos concedidos aos municípios na MP 255, à qual foram incorporados benefícios previstos na MP 252, a chamada "MP do Bem".

Inicialmente, entretanto, o governo chegou a incluir no texto uma regalia a mais aos Estados - a suspensão dos processos por crime tributário contra os Estados que aderissem ao programa. O próprio relator da MP 258, deputado Pedro Novais (PMDB-MA), responsável pela inclusão desse dispositivo - por sugestão do Ministério da Fazenda -, se dizia ontem surpreso com a medida.

"Incluímos isso sem muita análise", admitiu ontem o parlamentar, pouco depois de retirado esse dispositivo do texto, durante a votação dos destaques. Segundo Novais, o governo descobriu que o dito "perdão" a quem adere ao reparcelamento já estaria previsto na Lei 10.684, de 2002, que instituiu outro programa federal de parcelamento de débitos tributários, o Paes. Os outros pontos do texto questionados pela oposição foram mantidos, como a estrutura de carreira dos servidores. Os técnicos da Receita Federal, por exemplo, em greve por causa da MP, reivindicavam a unificação com a carreira dos auditores, mas só obtiveram um ajuste simbólico no texto, que os trata como "assessores" e não mais "subsidiários" da carreira de auditoria.

No Senado, os servidores manterão a pressão sobre a oposição, que pode complicar a vida do governo exigindo o prazo regimental de três sessões antes de votar a matéria. O PFL e o PSDB criticam a decisão do governo de criar a Super-Receita por medida provisória. Acham que o tema não era urgente o bastante para justificar o recurso a uma MP e o assunto poderia ter sido objeto de um projeto de lei. A mesma posição é defendida pelas corporações de servidores, que promovem um forte lobby Legislativo. Por isso, será difícil ao governo obter a cooperação dos senadores para votar rapidamente a MP 258.

PLANO : O governo aposta suas fichas na Receita Federal do Brasil, a Super-Receita, para aumentar a arrecadação por meio do aperto na fiscalização. Ela unifica sob um único comando a cobrança de todos os impostos e contribuições federais. A Super-Receita é o resultado da fusão da Secretaria da Receita Federal, encarregada de arrecadar e fiscalizar tributos sobre a renda e a produção, com a Secretaria da Receita Previdenciária, encarregada de cobrar as contribuições dos patrões e empregados para o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS). Essa superestrutura ficou sob o comando do Ministério da Fazenda. O chefe da antiga Receita, Jorge Rachid, é o novo "supersecretário".

A vantagem da fusão é que, em vez de ter dois grupos de fiscais trabalhando de forma isolada, o governo terá uma estrutura maior, trabalhando de forma integrada. Portanto, o número de contribuintes fiscalizados aumentará e a auditoria será feita sobre todos os tributos de uma só vez. Isso aumenta as chances de o fiscal cruzar dados e descobrir erros no cálculo dos tributos. Em 2006, a Super-Receita vai priorizar a fiscalização de setores intensivos em mão-de-obra, como empresas prestadoras de serviços, construção civil e microempresas.