Título: CPI deve cobrar do MST devolução de R$ 18 milhões
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 21/11/2005, Nacional, p. A7

A temperatura nos debates da CPI da Terra, que sempre foi alta, deverá subir ainda mais amanhã, com a leitura do relatório preparado pelo deputado João Alfredo (PT-CE). Ex-advogado do Movimento dos Sem-Terra (MST), ele focará sua atenção na questão da violência que envolve a disputa pela terra. Deverá apresentar uma lista com nomes de sem-terra ameaçados de morte em todo o País, pedir o indiciamento de proprietários supostamente envolvidos com atos de violência e sugerir providências para o combate ao trabalho escravo. Os parlamentares mais próximos dos ruralistas já estão com argumentos engatilhados para contestar o relator. O presidente da CPI, senador Álvaro Dias (PSDB-PR), vai pedir vistas do relatório e apresentar um texto alternativo, com outro foco: o desvio de verbas públicas que teria ocorrido em associações e cooperativas que representam a face legal do MST.

O senador disse ao Estado que deve solicitar o ressarcimento aos cofres públicos de R$ 18 milhões que teriam sido repassados à Associação Nacional de Cooperativas Agrícolas (Anca), à Confederação das Cooperativas da Reforma Agrária (Concrab) e ao Instituto Técnico de Capacitação e Pesquisa da Reforma Agrária (Iterra). "Na auditoria que o Tribunal de Contas da União (TCU) realizou a meu pedido, sobre o repasse de verbas para estas entidades, constatou-se o desvio de finalidade dos recursos", disse.

Dias está convencido de que será impossível os deputados e senadores da comissão mista chegarem a um acordo sobre o texto final. "Sempre tive dificuldade para coordenar a CPI", afirmou. "Desde o primeiro dia os debates foram apaixonados; e isso deve ser exacerbado agora, na reta final. Há uma profunda divisão entre parlamentares que apóiam o MST e os que estão ligados aos ruralistas."

O deputado Adão Pretto (PT-RS), alinhado na turma simpática ao MST, disse que seria uma tragédia se entidades ligadas ao MST fossem obrigadas a devolver recursos aos cofres públicos. Para ele, o debate é político - entre os que defendem as propostas de redistribuição de terras no País e os que pretendem torpedeá-las, atirando contra os movimentos que organizam os sem-terra.

Os deputados e senadores ruralistas - que formam uma das bancadas mais poderosas e bem articuladas do Congresso - são maioria na CPI. Os favoráveis ao MST, embora em desvantagem, ainda não perderam a esperança de chegar a um texto final que não seja desfavorável ao movimento. Contam sobretudo com os votos de parlamentares conservadores da base aliada. "Se não votarem conosco, que pelo menos se abstenham", disse o deputado.

A CPI da Terra foi criada há quase dois anos, a partir de uma reportagem publicada pelo Estado, que mostrava como o governo de Luiz Inácio Lula da Silva tinha retomado a política de convênios de instituições públicas com o MST, após ela ter sido congelada no período de Fernando Henrique Cardoso.