Título: Desvio supera R$ 10 milhões, diz CPI
Autor: Eugênia Lopes
Fonte: O Estado de São Paulo, 05/11/2005, Nacional, p. A12

Segundo Serraglio, o esquema de Valério também usou dinheiro de estatais em manobras iguais às que envolveram a Visanet

O relator da CPI dos Correios, Osmar Serraglio (PMDB-PR), está convencido de que o volume de dinheiro público que foi parar nas contas do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza para abastecer o mensalão é superior aos R$ 10 milhões identificados até agora pela comissão. Esse montante já confirmado, segundo Serraglio, foi oriundo de operação realizada a partir de uma empresa ligada ao Banco do Brasil, a administradora de cartões Visanet. Na avaliação do relator, o esquema irregular montado por Valério também serviu para direcionar dinheiro de estatais para o caixa 2 do PT em manobras semelhantes à do caso da Visanet. "Não são só R$ 10 milhões", disse Serraglio. Outros integrantes da CPI têm a mesma convicção. "Não tenho dúvidas de que o desvio de recursos públicos foi muito maior do que os R$ 10 milhões", afirmou o subrelator-adjunto da comissão, deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ). Entre as empresas públicas investigadas, estão os Correios, a Infraero e a Eletronorte.

As operações sob suspeita estão concentradas na área de publicidade, o que torna cada vez mais complicada a situação do ex-ministro Luiz Gushiken, que, como titular da Secretaria de Comunicação de Governo (Secom), coordenava toda a propaganda federal.

As investigações, dessa forma, começam a desvendar a origem dos reais que abasteceram o esquema organizado por Valério. Acumulam-se, ainda, as evidências de que o chamado esquema do mensalão realmente existiu, como denunciado pelo ex-deputado Roberto Jefferson.

Serraglio lembrou o resultado de cruzamento de dados promovido por outra CPI, a do Mensalão. O levantamento mostrou que pagamentos aos deputados eram feitos de forma regular, com periodicidade constante. "Não há mais dúvida de que houve o mensalão", disse ele - para quem os deputados que praticaram irregularidades devem sofrer penalidades nos tribunais, além das punições na esfera política.

MODELO

A partir da semana que vem, Serraglio pretende concentrar as investigações nas contas de Valério com a Visanet em 2003, época em que foram transferidos R$ 23,3 milhões pelo Banco do Brasil para a DNA Propaganda, agência do empresário mineiro. O pagamento corresponde à cota do BB no Fundo de Incentivo Visanet, integrado por outros bancos, para a divulgação da bandeira Visa, usada em cartões de crédito e débito.

A transferência foi feita pela Visanet em 19 de maio de 2003 e foi a título de antecipação por publicidade que seria feita pela agência de Valério. No dia seguinte, a DNA fez uma aplicação em um fundo de investimento do BB no mesmo valor de R$ 23,3 milhões. Seis dias depois, a SMPB, outra agência de Valério, obteve empréstimo de R$ 19 milhões no Banco Rural. Esse empréstimo consta da relação apresentada por Valério como sendo do PT.

Para Serraglio, esta operação é semelhante ao esquema montado por Valério em 2004 entre a DNA e a Visanet. Em 12 março de 2004, R$ 35 milhões da Visanet foram depositados na conta da DNA no Banco do Brasil. Três dias depois, a agência aplicou R$ 34,9 milhões em um fundo do BB. No dia 22 de abril, a DNA transferiu R$ 10 milhões para o banco BMG. Apenas quatro dias depois, o BMG emprestou R$ 10 milhões para a empresa Rogério Lanza Tolentino e Associados Ltda., que tem Valério entre seus sócios. "Como tenho como paradigma essa transação feita em 2004, estou aplicando a mesma tese para 2003", disse Serraglio.

Tanto o relator quanto Eduardo Paes estão certos de que outras estatais também usaram o mesmo esquema para transferir recursos para o caixa 2 do PT. "É claro que pode ter outras estatais no esquema", observou o relator.

PREJUÍZOS

Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) detectou que a DNA e outras quatro agências de publicidade contratadas pelo Banco do Brasil causaram um prejuízo de cerca de R$ 90 milhões ao banco. Esse valor é resultado da falta de repasse da chamada bonificação de volume, espécie de desconto tradicionalmente concedido pelos fornecedores de serviço às agências.

As bonificações dadas pelos fornecedores variam de 10% a 30% do valor dos pagamentos, mas esses descontos não foram repassados ao Banco do Brasil, segundo a auditoria do TCU.