Título: Epidemia de aids bate recordes
Autor: Jamil Chade
Fonte: O Estado de São Paulo, 22/11/2005, Vida&, p. A19

Este ano, os números da aids no mundo bateram todos os recordes. Apesar dos esforços internacionais, a doença ainda se espalha de forma mais rápida do que os resultados dos programas de combate à epidemia. Segundo dados divulgados ontem pela agência da ONU especializada no combate à aids, a Unaids, em 2005 o mundo terá registrado 5 milhões de novas infecções, mais de 3 milhões de mortes e um total de 40,3 milhões de pessoas infectadas pelo vírus HIV. Em 2003, esse número era de 37,2 milhões.

A população afetada pelo HIV no mundo é o dobro da que existia em 1995 e 64% dos novos infectados, ou 3 milhões de pessoas, estão na África. Mais de 500 mil crianças são soropositivas.

Desde 1981, a doença já matou 25 milhões de pessoas, o que a torna uma das epidemias mais trágicas já registradas. E o que é pior: segundo a Unaids, um dos principais problemas é que apenas 10% da população afetada fez o exame e sabe que está contaminada.

A maior proliferação do vírus está ocorrendo na Ásia e no Leste Europeu, que têm uma incidência da doença 25 vezes maior hoje do que em 1995. Outro fenômeno é o da predominância de casos da doença entre mulheres. Na África, 75% dos jovens infectados são do sexo feminino.

A única boa notícia vem de países como Quênia, Haiti, Zimbábue e Burkina Fasso, onde os altos índices da doença começam a retroceder. No Quênia, por exemplo, o índice de portadores do vírus HIV sofreu uma redução de 10%, no fim dos anos 90, para 7%, em 2003. Também no Caribe não há registro de aumento do número de casos.

"Estamos entusiasmados com os ganhos registrados em alguns países. Mas a realidade é que a epidemia continua a superar os esforços globais e nacionais para freá-la", afirmou o diretor da Unaids, Peter Piot.

AMÉRICA LATINA

Nunca a América Latina registrou um aumento no número absoluto de casos de aids tão grande num ano como em 2005. Foram 200 mil novos casos identificados na região e o número de portadores da doença já chega a 1,8 milhão. Em 2003, o aumento havia sido de 170 mil. No total, 66 mil latino-americanos morrerão de aids em 2005.

Segundo a Unaids, mais de um terço da população contaminada na América Latina está no Brasil. Os motivos são a população numerosa e uma alta taxa de jovens que não sabe como a doença é transmitida. Mas, em porcentagem da população, o Brasil ainda tem uma taxa pequena, menos de 0,5%.

Na região, os casos mais graves são o da Guatemala e o de Honduras, onde a contaminação atinge perto de 1% da população. No Paraguai, a ONU alerta para a alta incidência da doença nas fronteiras com Brasil e Argentina. Os principais motivos para o crescimento da aids na América Latina são o consumo de drogas com seringas infectadas e relações sexuais sem proteção.

DIFICULDADES

Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a saída para lutar contra a doença é o fortalecimento dos programas de prevenção e tratamento. Pelos cálculos da Unaids, o mundo precisa, para isso, de US$ 8,6 bilhões em 2006 e US$ 10 bilhões em 2007. O problema é que o déficit entre 2005 e 2007 chega a US$ 18 bilhões. Sem recursos suficientes, apenas 1 milhão de pessoas conta com acesso gratuito ao tratamento. Na África, só 10% da população infectada tem acesso aos remédios. Na Ásia, a taxa chega a 15% da população.

A OMS reconhece que não conseguirá cumprir até o fim deste ano o objetivo de dar tratamento a 3 milhões de pessoas, mas informa que até 350 mil mortes foram evitadas em 2005 graças à expansão do tratamento.

A Unaids e a OMS também apontam que os preservativos são hoje a "tecnologia disponível que mostra maior eficácia na prevenção" e 55% dos novos casos de infecção poderiam ser prevenidos na África se a população tivesse acesso garantido a eles.