Título: Lula faz acordo com Palocci, que por enquanto continua no cargo
Autor: Vera Rosa e Tânia Monteiro
Fonte: O Estado de São Paulo, 23/11/2005, Nacional, p. A4

Ao menos por enquanto, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, ficará onde está. Depois de um fim de semana de incertezas e de uma segunda-feira muito tensa, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Palocci começaram a chegar a um acordo. Lula deu sinal verde para que, na prática, o superávit fiscal - economia de gastos para pagamento dos juros da dívida - fique em torno de 4,6% a 4,7% do Produto Interno Bruto (PIB), embora a meta formal seja de 4,25%. É a repetição do resultado fiscal de 2004 e mais do que desejava a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, que tem feito duras críticas à ortodoxia da política econômica. Palocci também conseguiu do presidente o compromisso de manifestar-se publicamente de forma mais enfática a seu favor. O que Lula começou a fazer ontem mesmo, em discurso quando foi a Luziânia (GO) para um congresso de agricultura familiar (veja na página A7).

Ontem à noite, ainda aborrecido com o resultado da pesquisa CNT/Sensus - que indica piora na avaliação do governo -, Lula telefonou para Palocci. Cumprimentou-o pelo depoimento à Comissão de Finanças e Tributação da Câmara. "Eu não sei de onde está saindo tanta fofoca de que você vai sair", disse-lhe, segundo o relato de um auxiliar.

O clima de tensão entre Lula e Palocci, porém, existiu. Chegou a tal ponto que, informado da disposição do ministro de não comparecer segunda-feira à solenidade de sanção da MP do Bem - que reduziu os impostos para o setor exportador -, o presidente teve de ligar para ele. Pediu que comparecesse à cerimônia. Palocci foi, mas, apesar dos elogios públicos dirigidos a ele por Lula, ficou carrancudo durante todo o tempo.

Embora tenha defendido o ministro, Lula também não perdeu a chance de manifestar sua contrariedade. Ele não gostou quando Palocci insinuou à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, em depoimento na quarta-feira, que não ficaria no governo se sua política mudasse. "A minha força é para realizar este projeto, e não outro", argumentou Palocci.

CANGA

O presidente ficou irritado. Motivo: achou que o tom do ministro foi de desafio, como se a política econômica fosse uma obra apenas palocciana, e não trabalho do governo. "Ninguém põe canga no Lula", comentou um interlocutor do presidente. Não foi à toa que, ainda na segunda-feira, Lula mostrou seu aborrecimento. "Neste governo não tem política econômica do ministro Palocci. Tem política econômica do governo, que envolve toda a complexidade do que significa o governo", discursou.

No mesmo dia, Palocci também não foi à reunião da Junta Orçamentária. Alegou que não queria compactuar com a "gastança" defendida pela ministra Dilma. à noite, no entanto, ele e o presidente se acertaram.

Palocci disse que não considera "correto" ser desautorizado por Dilma publicamente. Depois de uma entrevista ao Estado, há duas semanas, na qual chamou o plano de ajuste fiscal de "rudimentar", a chefe da Casa Civil voltou a escancarar as divergências na sexta-feira, ao lembrar que o debate mal estava começando. O ministro também afirmou que não poderia afrouxar o ajuste fiscal. Foi então que Lula garantiu a Palocci que não planeja a abertura desenfreada dos cofres para pavimentar sua reeleição, em 2006.

RESULTADO

No Palácio do Planalto, a avaliação é de que a estratégia desencadeada pelo ministro para se fortalecer acabou dando resultado, já que, ao invés de ser convocado a depor, ele foi "convidado" a ir à CPI dos Bingos, até o próximo dia 10, para esclarecer denúncias de corrupção na prefeitura de Ribeirão Preto durante suas administrações (1993 a 1996 e de 2000 a 2002).

"Essa atitude de trocar a convocação pelo convite ajudou a acalmar os ânimos", afirmou o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP). "As coisas estão se distensionando." O senador Tião Viana (PT-AC) foi na mesma linha: "Palocci não quer sair do governo. Quer ser prestigiado."

O ministro das Relações Institucionais, Jacques Wagner, foi destacado por Lula para reforçar a tropa de choque de Palocci no depoimento que ele prestou ontem à Comissão de Finanças e Tributação.

Num dos intervalos do depoimento, Palocci avistou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), seu ex-colega no PT, e convidou-o para jantar. "Mas eu vou jantar com o ministro ou com o Toninho?", perguntou Alencar, que é amigo de Palocci. "Com o ministro, espero", respondeu o titular da Fazenda.