Título: Merkel já está à frente da Alemanha
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Fonte: O Estado de São Paulo, 23/11/2005, Internacional, p. A15

Depois de 65 dias de uma batalha em que converteu adversários políticos em aliados, a democrata-cristã Angela Merkel foi eleita ontem chanceler (chefe de governo) da Alemanha por 397 votos a 202. Ela assume com a difícil tarefa de superar as diferenças políticas existentes na grande coalizão com os social-democratas (a primeira desde os anos 60 e a segunda do pós-guerra) para alcançar objetivos como os de reativar a economia e criar empregos. Como a coalizão reúne políticos de idéias diametralmente opostas, o ímpeto por mudanças poderia ser bloqueado. De qualquer forma, Merkel já concretizou um objetivo, um sonho que acalentava havia pelo menos seis anos, quando assumiu a liderança da União Democrata-Cristã (CDU): ser a primeira mulher a chefiar o governo alemão. O feito não tem paralelo. Ela é a primeira mulher a dirigir os destinos de uma das três maiores economias do mundo - a Alemanha está atrás somente dos EUA e Japão.

Merkel vislumbrou a possibilidade de quebrar o tabu em 1998, quando a CDU sofreu humilhante derrota eleitoral para os social-democratas de Gerhard Schroeder. Nesse ano, ela assumiu a secretaria-geral da CDU, feito inédito até então num país de larga tradição de supremacia política masculina.

Mas foi este ano, quando Schroeder, sob pressão de correligionários descontentes com os rumos de suas reformas econômicas e sociais, decidiu antecipar as eleições, que o sonho de Merkel tomou contornos de realidade. De início, as pesquisas a favoreciam amplamente. Ela orientara a campanha eleitoral para uma rápida solução do principal problema do país: o desemprego, que atinge quase 10% da população economicamente ativa. Mas cometeu equívocos estratégicos ao indicar nomes impopulares para planejar a política econômica.

Schroeder soube tirar proveito da situação. Carismático e competente no palanque, venceu a sóbria rival num debate na TV. Não conseguiu reverter a tendência, mas fez com que seu partido chegasse a encostar na CDU. As eleições de 18 de setembro terminaram praticamente empatadas, com uma vantagem de apenas três cadeiras para a coalizão liderada pela CDU. Esse quadro gerou um impasse. O experiente Schroeder tentou apegar-se ao cargo, mas Merkel resistiu com tenacidade. A solução encontrada também foi histórica. As duas correntes, embora de ideologias conflitantes, decidiram se unir. Merkel acabou ganhando a queda-de-braço com Schroeder, que se retirou da política.

Com a ascensão de Merkel, elevou-se a cinco o total de mulheres que governam países. Elas estão à frente na Nova Zelândia, Bangladesh, São Tomé e Príncipe e Moçambique.