Título: Avaliação da educação vira regra
Autor: Renata Cafardo
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/11/2005, Vida&, p. A28

Aneb, Enade, Enem e outros ajudam na hora de criar políticas públicas e dirigir investimentos. Mas especialistas têm críticas

As siglas confundem. Saeb que virou Aneb , Enade que era Provão e também Enem, Saresp e Encceja, assim mesmo, com dois c. Mas hoje não se faz educação sem avaliação. É um consenso entre educadores no Brasil e no mundo. Políticas públicas e investimentos são dirigidos conforme os resultados das provas feitas pelos alunos e organizadas pelos governos, não por seus professores. Há dez anos, com o primeiro Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb), o Brasil começou a diagnosticar a escola, de fora da escola. Neste mês, os estudantes brasileiros tiveram pelo menos quatro dessas provas pela frente. Ontem e hoje, foram os dias do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja), criado neste ano para avaliar quem conclui o antigo supletivo. No início de novembro, meninos e meninas paulistas do ensino fundamental e médio fizeram o Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp). São provas de português e matemática elaboradas pela empresa ganhadora da licitação. Cada série faz o mesmo exame, não importa se o aluno está na escola pública da capital ou numa particular no interior do Estado.

¿Antes das avaliações, se fazia política pública de educação só com achismo¿, diz o secretário Estadual da Educação, Gabriel Chalita. Ele conta que o Saresp serviu tanto para quebrar mitos ¿ por exemplo, o de que as escolas rurais eram piores do que as da periferia da capital ¿ como para decidir em que apostar. Os resultados mostraram deficiência em leitura; o Estado criou um programa em que uma hora é separada para as obras literárias na sala de aula. Também indicaram que escolas nas quais diretores permaneciam por muito tempo tinham desempenho melhor. Uma norma exige hoje, no mínimo, dois anos no posto para esses profissionais.

¿A gente faz as provas, mas a escola pública não melhorou ainda¿, diz o estudante Gustavo Ribeiro Sanchez, de 18 anos, que neste ano participou do Saresp e do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Ao longo dos anos, os alunos brasileiros também pouco melhoraram suas notas nas avaliações, mas a série histórica de resultados já ajuda nas políticas públicas.

A escola de Gustavo ainda foi selecionada na amostra da Avaliação Nacional da Educação Básica (Aneb), realizada na semana retrasada. A Aneb é o novo Saeb; igualzinho, só o nome mudou. Assim como a maioria das que existem, é realizada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), órgão do Ministério da Educação (MEC). Foi o Saeb que revelou dados alarmantes como o de que 60% das crianças brasileiras que terminam a 4ª série não sabem ler corretamente.

A constatação fez que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passasse a dizer que o País precisava de uma prova nacional para todas as crianças, escola por escola. O Saeb é feito por amostragem e revela apenas resultados por regiões. Lula insiste nisso, desde que assumiu. A resposta veio neste ano com a Avaliação Nacional do Rendimento Escolar (Anresc), que ganhou o apelido ¿ pronunciável ¿ de Prova Brasil. Ela foi feita pela primeira vez na semana passada com todos os alunos de 4ª e 8ª séries do País.

¿O governo federal não é gestor de rede de escolas, por isso não faz sentido esse exame universal¿, diz o ex-ministro da Educação Paulo Renato Souza, que ajudou a criar a cultura de avaliação no País, inaugurando o Saeb, o Enem e o Provão. Seu argumento é o de que os exames universais ¿ de que todos os alunos participam ¿ só têm significado quando feitos pelos Estados ou municípios, que são os responsáveis pelas escolas. Assim, não adiantaria saber que uma escola de Pernambuco tem dificuldade em matemática, por exemplo, se o MEC não pode resolver o problema diretamente.

A Prova Brasil custa R$ 54,9 milhões; é a mais cara de todas. Participaram 5 milhões de alunos, outro recorde. Aneb (ex-Saeb) e Prova Brasil têm conteúdos semelhantes. Mas o MEC argumenta que não poderia apenas universalizar o Saeb porque, com a mudança, se interromperia uma importante série histórica de resultados.

SEM GASTAR UM TOSTÃO

Alguns Estados e municípios, no entanto, gostaram da novidade. O secretário municipal de Educação, José Aristodemo Pinotti, fez elogios à idéia do PT. ¿Não vamos gastar um tostão¿, diz. Pinotti convocou uma equipe para analisar os resultados das crianças da capital. Ele preferiu aderir à Prova Brasil a participar do Saresp, em que as prefeituras precisam pagar R$ 1,67 por aluno. A capital fará ainda um exame próprio em 2006 para 4ª e 8ª séries.

[TEXTO]Paulo Renato critica outras decisões do Inep sob o comando do PT. Não gosta do novo Provão, o Exame Nacional de Desempenho do Estudante (Enade). Para atingir mais cursos, o Enade é feito por amostragem, diferentemente do seu antecessor. Nesse caso, o ex-ministro lembra que as universidades são responsabilidade do MEC e, portanto, o exame precisaria ser universal para retratar bem cada curso em cada instituição.

Concordando ou não com os métodos, os dirigentes de ontem e de hoje são unânimes em defender as avaliações. ¿A gente nunca saberia que o Brasil está mal em relação aos outros países em educação se não fosse o Pisa¿, diz o recém-assumido presidente do Inep, Reynaldo Fernandes. O exame, feito pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômicos (Ocde), tem mostrado que o País tem um dos piores desempenhos em leitura e matemática. ¿Nessa era do conhecimento, a pessoa tem de aprender a vida toda. As avaliações medem a capacidade de aprender¿, diz Paulo Renato.

Por isso, as modernas avaliações não são necessariamente divididas em disciplinas nem cobram conteúdos. O Pisa, o Saeb e Saresp usam textos para medir as competências e habilidades das crianças em leitura e escrita, a capacidade de aplicar seus conhecimento no mundo real. Avaliam, ainda, resolução de problemas e interpretação de gráficos.

Os alunos e professores também preenchem questionários sobre situação socioeconômica, computadores, formação. Os resultados são cruzados com o desempenho dos alunos e mostram a importância de cada item na aprendizagem. O primeiro Saeb, em 1995, indicou que alunos cujos professores eram formados em ensino superior se saíam melhor nos exames. Em 1996, o governo formulou a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), determinando o curso superior como uma exigência para professores.