Título: CPI da Terra ameaça MST com relatório desfavorável
Autor: Roldão Arruda
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/11/2005, Nacional, p. A17

Parlamentares simpáticos aos sem-terra querem mobilização da base aliada

Acendeu a luz vermelha entre parlamentares simpáticos ao MST. Estão cada vez mais preocupados com o rumo que as coisas tomaram na CPI da Terra e a possibilidade de ser aprovado um relatório desfavorável ao movimento. Acredita-se que a CPI teria 8 parlamentares ao lado do MST e 16 na banda de lá. Segundo o deputado Adão Pretto (PT-RS), um dos porta-vozes dos sem-terra no Congresso, o clima de antagonismo na CPI chegou a níveis intransponíveis. Tanto que, em vez de um, estariam sendo redigidos dois relatórios finais. Um será assinado pelo relator, deputado João Alfredo (PT-CE), simpático à causa da reforma agrária. O outro sairá das mãos do presidente da comissão, senador Álvaro Dias (PSDB-PR).

Às turras com o relator desde o início, Dias dedicou-se sobretudo a investigar as contas das instituições que representam legalmente o MST ¿ como a Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca) e a Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária (Concrab). Fez verdadeira devassa, apesar dos protestos dos sem-terra.

Dias tem repetido que encontrou irregularidades em convênios assinados entre estas entidades e o governo. No seu relatório, deve pedir o rompimento de alguns convênios, além do ressarcimento de recursos aplicados indevidamente.

Só do Iterra, o instituto gaúcho que representa a face legal do MST na área da educação e assina convênios com várias entidades do governo, seria pedida a devolução de R$ 3 milhões. A Anca e a Concrab também seriam intimadas.

APELO

Na semana passada, Pretto pediu ao Planalto que tente mobilizar a base aliada e impedir a aprovação de um relatório desfavorável. O secretário-geral da Presidência, Luiz Dulci, encarregado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva do diálogo com movimentos, associações, organizações religiosas e sindicatos, não vê problemas nos convênios que o atual governo celebrou com o MST. Para ele, os convênios são bem-sucedidos e os repasses, administrado de forma rigorosa.

Na quinta-feira, durante uma cerimônia na Escola Nacional do MST, em Guararema, ele disse: ¿Se tem gente que usa bem o dinheiro dos convênios, é a gente dos movimentos sociais.¿ Ainda segundo Dulci, os convênios são vistoriados constantemente para impedir irregularidades.

O ministro suspeita que a investida contra os convênios seja um ataque disfarçado à política de reforma agrária: ¿Golpeia-se os movimentos com argumentos falsos, para atingir a reforma agrária.¿ Apesar do aperto no Congresso, o diálogo entre MST e governo é cada vez melhor. Na sexta-feira à noite, durante uma palestra para os metalúrgicos de São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, contou que tem feito reuniões com representantes do MST para discutir a transposição do Rio São Francisco; e que está celebrando convênios com assentamentos rurais para produção de mudas de árvores que serão usadas na recuperação das matas ciliares do rio.

Tanta proximidade tem provocado certa ambigüidade no comportamento do MST. Embora repudie a política econômica e reclame dos números pífios de assentamentos no atual governo, o movimento se beneficia da retomada de convênios com entidades públicas e do bom tratamento que recebe nos gabinetes oficiais. A expressão ¿ruim com ele, pior sem ele¿ tem sido usada com freqüëncia para definir a situação. Nesse cenário de bonança e ambigüidade, o relatório da CPI é visto como trovoada.