Título: Vítimas da crise vão ganhar a vida fora do PT
Autor: Ana Paula Scinocca, Mariana Caetano
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/11/2005, Nacional, p. A7

Delúbio tenta recuperar vaga de professor em Goiânia, Silvio Pereira quer montar pousada e Genoino prepara volta à Câmara

Depois de anos de dedicação ao partido que teve seu ápice com a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, encarar a vida fora do PT não é tarefa fácil. Principalmente se for levado em conta que a saída não foi pela porta da frente. Poucos meses depois de terem deixado para trás os quadros do maior partido de esquerda do País, Delúbio Soares, Silvio Pereira e José Genoino tentam digerir, cada um a seu modo, a nova rotina. Silvio quer montar uma pousada em Ilhabela. Genoino escreve um livro sobre sua trajetória e a crise. Mas de todos que viram ruir sua participação para o crescimento da sigla, o mais abatido é o pivô do escândalo do mensalão. Ex-dono do cofre petista, Delúbio Soares, mais magro, fumando menos, não se acostumou a ser um ex-dirigente do PT. Expulso do partido no fim de outubro, ele ainda não se libertou da mágoa que nutre exatamente por aquele que o fez chegar à tesouraria da legenda, o presidente Lula. Não se conforma com o ¿abandono¿ do amigo de longa data, dos tempos de militância no movimento sindical. Ao seu lado, além da mulher, ex-secretária de Assuntos Institucionais do PT Mônica Valente, poucos amigos. E, reclama ele, quase nada de dinheiro. É Mônica, segundo um dos petistas que ainda mantêm estreita relação com Delúbio, quem tem sustentado a casa. Por enquanto, ele luta na Justiça para ser reintegrado como professor de matemática em Goiânia e recuperar o salário de cerca de R$ 1 mil, como revelou o Estado.

Funcionária pública, Mônica trabalha na primeira secretaria da Assembléia Legislativa paulista. Foi transferida recentemente. ¿Lamento que alguns companheiros tenham criado resistência, dizendo que a presença da Mônica criaria constrangimento à bancada, mas a maioria foi solidária¿, diz o primeiro-secretário, Fausto Figueira. ¿É um privilégio ter ela aqui.¿ Seu salário, afirma o deputado, não chega a R$ 6 mil.

O PT vai pagar ¿quando puder¿ o contrato fechado com o escritório do advogado Arnaldo Malheiros Filho, que faz a defesa de Delúbio e Silvio Pereira, ambos ameaçados de indiciamento. São R$ 300 mil para um contrato que venceu em outubro. O presidente do PT, Ricardo Berzoini, jura que o partido não assumirá nova despesa com seus desfiliados, mas dirigentes sustentam que o acordo já foi firmado e Delúbio não será deixado ao relento. ¿Na pior das hipóteses vamos fazer uma vaquinha¿, diz um integrante da direção nacional petista.

Na contramão do estado de melancolia de Delúbio está Silvio Pereira, ex-secretário-geral do PT. ¿Ele já virou a página, está tocando a vida¿, relata outro dirigente. Passa mais tempo na sua confortável casa de Ilhabela, no litoral norte de São Paulo, do que na capital. Revelou a amigos planos de montar uma pousada por lá. Para isso, poderia vender o apartamento no centro de São Paulo.

Apoiado pelo mulher, Débora, Silvio brinca que tem sido, na maior parte do tempo, babá da única filha, de 2 anos. Trocou o Land Rover que marcou seu afastamento do PT ¿ presente de um diretor da GDK, que presta serviços à Petrobrás ¿ por uma picape Courier, mais modesta. Funcionária da prefeitura de Osasco, Débora garantiria o sustento da família.

CANDIDATURA

Menos preocupado com o orçamento, José Genoino, agora deputado aposentado com rendimento de cerca de R$ 8 mil mensais, começa aos poucos a sair da toca. Tem mantido alguns encontros políticos, mas garante que não decidiu se disputará uma vaga na Câmara em 2006. ¿É importante que ele seja candidato¿, diz Paulo Frateschi, presidente do partido em São Paulo. ¿E ainda vai puxar votos para o PT.¿

Genoino se mantém longe da mídia. Prepara um livro sobre sua trajetória política e a crise, mantido em segredo, e auxilia na conclusão de outro texto sobre a Guerrilha do Araguaia.