Título: Exportador quer mais incentivos
Autor: Irany Tereza, Jacqueline Farid
Fonte: O Estado de São Paulo, 20/11/2005, Economia & Negócios, p. B13

Empresários queixam-se de `entraves¿ internos e vão apresentar queixas em seminário no Rio que será aberto por Lula na 4.ª-feira

RIO - Febre aftosa, desvalorização do dólar em mais de 16% no ano, juros de 19%, MP do Bem restrita a um grupo estimado em 125 empresas. Um quadro desalentador, que deverá contribuir, este ano, para a saída de mil empresas do rol de exportadores, projeta a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB). Paradoxalmente, as vendas externas do Brasil em 2005 já ultrapassaram a marca emblemática de US$ 100 bilhões. O aumento do preço das mercadorias no mercado internacional e o crescimento do volume vendido pelas grandes exportadoras suplanta as desvantagens competitivas. Nesse cenário de contradições será realizado no Rio, a partir de quarta-feira, o 25º Encontro Nacional de Comércio Exterior (Enaex ), no qual empresários deverão cobrar do governo uma política agressiva de incentivo às exportações. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva abrirá o evento.

Há um consenso: o bom desempenho da balança comercial brasileira se deve a um excelente momento do mercado internacional. ¿O mundo está como céu de brigadeiro. No País, só estamos enfrentando entraves¿, diz José Augusto de Castro, vice-presidente da AEB, que coordena o Enaex.

A taxa internacional de crescimento do comércio deve fechar o ano entre 10% e 12%, estimam especialistas. O Brasil ficará bem acima da média, em torno de 20%, mas atrás da China, com crescimento previsto de 30%. A recuperação de mercados perdidos principalmente para a China é um dos principais desafios para exportadores brasileiros.

¿Em 35 anos de comércio exterior, nunca vi o setor tão abatido como agora. A sorte é que a situação internacional é extremamente favorável. Mas, à exceção do Ministério do Desenvolvimento, as outras áreas do governo, como a Receita Federal e o Banco Central (BC), parecem não saber o que querem e são pródigas em tomar medidas anti-exportação¿, critica Roberto Gianetti da Fonseca, ex-secretário da Câmara de Comércio Exterior e atual presidente da Silex Trading S/A.

O setor exportador, diz, é marcado principalmente pela temporalidade. A defasagem entre medidas adotadas e suas conseqüências é de cerca de dois anos. ¿O real é hoje a moeda mais valorizada do mundo em relação ao dólar. Nem euro, nem iene, nem nenhuma outra conseguiu esta façanha. Esse câmbio flutuante é esdrúxulo num mercado imperfeito como o do Brasil. E a inércia do Banco Central é inadmissível. O ambiente está péssimo.¿

Segundo o economista Fernando Ribeiro, da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex), o câmbio ¿não deve atrapalhar as exportações no ano que vem, mas os efeitos podem se fazer sentir em dois ou três anos¿.

Ribeiro concorda que o forte crescimento das exportações brasileiras a partir do final de 2002 está relacionado a efeitos da mudança de regime cambial em 1999 e à conjuntura internacional favorável. Segundo ele, o ¿boom¿ exportador não se deve a nenhuma mudança significativa da estrutura das exportações do País. Nesse contexto, o ¿dado notável¿ é que o Brasil ¿foi capaz de embarcar numa onda internacional favorável, por causa da mudança estrutural ocorrida nas empresas do País nos anos 90¿.

Ele classificou como espetacular o crescimento das exportações, que projeta média anual de 24%, em termos históricos. ¿Isto não acontecia desde o milagre econômico, entre 1967 e 1974, quando chegou a um aumento médio anual de 25%.¿ Ribeiro ressaltou que a participação das exportações no PIB do País subiu de 6,5% em 1998 para 16% em 2004 e deve aumentar um pouco em 2005, ¿apesar do câmbio¿.

A AEB fez um levantamento, com base em atos declaratórios da Receita Federal publicados em Diário Oficial e concluiu que apenas 125 empresas exportadoras poderão desfrutar os benefícios de desoneração de custos da MP do Bem. ¿É muito pouco. No ano passado, tivemos 18.608 empresas exportadoras. Este ano, até setembro, 610 já abandonaram o segmento e nossa estimativa é de sejam em torno de mil até o fim de dezembro. Não há aumento de competitividade desse jeito¿, reclama.

As candidatas aos benefícios da MP do Bem são as chamadas ¿exportadoras líquidas¿, que vendem no exterior 80% do que produzem no Brasil. Castro diz que não há como saber exatamente quantas são as empresas preponderantemente exportadores porque desde 1997, alegando sigilo comercial, a Receita deixou de divulgar os nomes das empresas e o volume exportado de cada uma. ¿Não temos acesso às estatísticas oficiais¿, afirma o executivo.

De acordo com a Funcex, o crescimento recente das exportações do País foi baseado em empresas já estabelecidas no mercado externo. No período de 1998 a 2004, segundo dados da fundação, a contribuição dos novos exportadores no crescimento das exportações do País foi relativamente pequena, de 8,6%, enquanto as empresas já estabelecidas responderam por 83% da expansão.

Além disso, segundo Fernando Ribeiro, não houve uma mudança estrutural na composição da pauta de exportações do País. ¿O agronegócio, curiosamente, não ganhou espaço nas vendas externas nos últimos anos e se manteve em 2004 com a participação quase inalterada ante anos anteriores, de 40% do valor exportado¿, destacou o economista.