Título: Viúva de ambientalista morto recebe promessa de ministra
Autor: Lisandra Paraguassú
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/11/2005, Vida&, p. A14

Marina Silva esteve ontem na casa de Iracema e garantiu, de novo, apoio do governo

Na casa grande onde morou por 30 anos, com pátio cheio de árvores e bichos, a viúva do ambientalista Francisco Anselmo de Barros, Iracema Sampaio, recebeu ontem a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, com um almoço feito em panela de ferro. Marina foi dizer a Iracema que o governo está trabalhando para impedir a aprovação do projeto que autoriza a construção de usinas de álcool em áreas próximas do Pantanal, defendido pelo governador de Mato Grosso do Sul, Zeca do PT. Ouviu da viúva que o ambientalista, conhecido como Francelmo, festejou quando ela foi indicada para o ministério e também que o marido fez o que achava necessário ao atear fogo ao próprio corpo em protesto, no sábado. Ele morreu no domingo.

"Ele não pensou na gente quando tomou essa decisão. Se pensasse, atrapalhava. Fez o que achava que devia fazer para salvar esse pedaço da casa de Deus", disse Iracema, de 67 anos, casada por 32 anos com ele e mãe de três filhos adotivos. Ainda abalada, ela tenta entender. Afirmou que ele também não pensou em si, mas "numa causa maior, mais justa". "A gente vai ter de aceitar."

Nas 16 cartas que deixou para família, amigos e imprensa, Francelmo mostrou que já sabia o impacto que sua atitude causaria - e poderia enterrar o projeto de construção das usinas.

Depois de admitir que a decisão não tinha sido fácil, deixou instruções para seu enterro. "Faça o velório na capela 13, dá mais repercussão", disse na carta dirigida a Jorge Gonda, que, a seu pedido, deverá presidir a ONG fundada e presidida por ele, a Fundação para Conservação da Natureza de Mato Grosso do Sul.

Na noite antes de morrer, Francelmo não dormiu. Iracema conta que ele a fez dormir com a cabeça em seu ombro. Hoje, ela sabe, era uma despedida. Naquele dia, brincou: "Acho que vem mais uma lua-de-mel por aí."

Em carta aos amigos, Francelmo explica que foi difícil tomar a decisão "em sã consciência". Mas a defende: "Minha vida sempre foi um sacerdócio em defesa da natureza. Ela é a nossa casa e o presente maior de Deus. Se Ele deu a vida por nós, eu estou dando a vida por Ele, defendendo o futuro de nossos filhos. O mundo corre perigo e esta é a minha modesta contribuição", escreveu.

DESMATAMENTO

O Ministério do Meio Ambiente manifestou em nota, ontem, discordância com o relatório da ONU, divulgado anteontem, que aponta o Brasil como o campeão mundial em devastação de florestas nativas. A expectativa do ministério é de que haja, neste ano, queda de 40% no número de casos de desmatamento no País.