Título: CPI deixa mensalão de lado e improvisa relatório
Autor: João Domingos
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/11/2005, Nacional, p. A6

Prazo da comissão acaba hoje e dificilmente será aprovada prorrogação dos trabalhos

A CPI do Mensalão deverá encerrar hoje as atividades sem concluir que houve, efetivamente, o mensalão - mesada para que parlamentares da base aliada votassem a favor de projetos de interesse do Palácio do Planalto. A oposição ainda tentará colher as 171 assinaturas de deputados necessárias para prorrogar os trabalhos, mas sabe que isso será muito difícil. Para o deputado José Rocha (PFL-BA), encarregado de convencer os parlamentares a assinar, a tarefa é quase impossível. Sem prazo para avançar nas investigações, o relator da CPI, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), deverá ler um relatório fraco, no qual vai dizer apenas que houve repasses de dinheiro de origem irregular a políticos, mas não com a periodicidade denunciada pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ). Registrará, ainda, o uso de pelo menos R$ 55,9 milhões, via caixa 2 dos partidos.

"Vou dizer que parte do dinheiro empregado nas campanhas eleitorais para governador, em 2002, e para prefeito, em 2004, tem origem ilícita. E que o dinheiro serviu para o pagamento vantagens indevidas a deputados. Mas não posso usar o termo mensalão, porque não tenho certeza de que foram feitos pagamentos mensais", explicou Abi-Ackel.

Que houve pagamento não há dúvidas, afirmou o relator. "Não posso dizer se o repasse de dinheiro ocorreu de uma vez só ou em várias vezes. Fica a suspeita de que pode ter havido as duas formas. O problema é que não tenho como provar."

Abi-Ackel assegurou, ainda, que os empréstimos de Marcos Valério para o PT foram de fachada. "Muito antes que um ex-diretor do Banco Rural fizesse essa afirmação para a revista Época, eu já tinha certeza da suspeição dos empréstimos de Marcos Valério ao PT. Examinei as execuções todas no Fórum de Belo Horizonte e cheguei à conclusão de que são empréstimos inconvincentes."

Diante do quadro desolador do fim da CPI sem a apuração completa, o seu presidente, Amir Lando (PMDB-RO), fez ontem um apelo dramático para que os trabalhos não sejam interrompidos hoje.

Antes de ficar incomunicável no interior de Rondônia, Lando concedeu entrevista à rádio CBN para dizer que seria "uma grande frustração" o fim da CPI sem o relatório final. O senador acha difícil aprovar na Câmara o requerimento para a prorrogação dos trabalhos.

"A CPI é muito partidarizada", destacou Lando. Ele acha que o medo generalizado levará a CPI à bancarrota. "Os partidos se sentem ameaçados e acabam ficando na defensiva. Nenhum partido quer assinar, porque há muitas questões envolvendo alguns parlamentares."

Lando disse que não percebeu por parte do governo federal nenhuma "operação abafa", tampouco viu sinal de cooperação para que os trabalhos sejam prorrogados.

José Rocha, escolhido pela oposição para recolher o apoio necessário à prorrogação da CPI, achava difícil chegar às 171 assinaturas - até a tarde de ontem só tinha conseguido 15. "O PFL e o PSDB estão mobilizados e todos deverão assinar o pedido de prorrogação. Mas isso não é suficiente", admitiu.

O senador Sibá Machado (PT-AC), que atua como líder do governo na CPI, disse que o relatório de Abi-Ackel será aprovado sem dificuldades, desde que não sustente a tese do mensalão. "Isso não ficou provado. O que ficou provado foi o uso de dinheiro irregular por parte dos partidos", sugeriu.

Se não concluiu pela existência do mensalão, a CPI também não comprovou que houve compra de votos para a reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso, como o governo queria provar.