Título: Palocci decide falar hoje no Senado para tentar driblar CPI
Autor: Vera Rosa, Rosa Costa
Fonte: O Estado de São Paulo, 16/11/2005, Nacional, p. A4

Antecipação de depoimento, que estava marcado para o dia 22, é estratégia para abortar eventual convocação da Comissão dos Bingos

Preocupado com seu desgaste político e os reflexos da crise sobre o mercado financeiro, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, antecipou para hoje os esclarecimentos que prestará à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. O depoimento de Palocci estava marcado para o próximo dia 22, mas a estratégia governista de apressar sua fala tem o objetivo de conter a fúria da oposição e abortar uma eventual convocação do ministro para depor na CPI dos Bingos. Líderes do governo negociaram ontem com integrantes do PSDB e do PFL a ida do titular da Fazenda ao plenário do Senado para explicar as denúncias de corrupção feitas por seus ex-auxiliares na prefeitura de Ribeirão Preto. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer manter Palocci no cargo e pôr um ponto final nas especulações sobre sua saída. Na prática, hoje será o Dia D do ministro: sua permanência na equipe depende de seu desempenho. Em conversas reservadas, Lula já disse que enfraquecer o ministro é um "suicídio" e não permitirá "brincadeira" com a economia. Ainda hoje, ele pretende aproveitar um discurso para defender Palocci e reagir aos ataques.

Palocci retornou a Brasília na segunda-feira à noite, depois de três dias de descanso. Conversou ontem várias vezes com Lula, que lhe pediu calma para superar o momento difícil.

Contrariado com o tiroteio e o fogo amigo no Planalto, Palocci disse ao presidente que pretende continuar na Fazenda se suas explicações forem consideradas suficientes. Se tiver de depor numa CPI, avalia que ficará desmoralizado e, nesse caso, seria melhor sair. Não é esse, porém, seu desejo.

Ao longo do dia, o ministro reuniu-se com petistas e colaboradores, entre eles Murilo Portugal, secretário-executivo da Fazenda. Decidiu que seria melhor antecipar os esclarecimentos para tentar dar a volta por cima, como fez no dia 21 de agosto, quando concedeu entrevista coletiva para se defender das acusações do advogado Rogério Buratti e saiu-se bem. Seu silêncio diante de novas denúncias tem dado margem a boatos e prejudicado a economia. Na segunda-feira, a Bolsa caiu, o dólar subiu e o risco país avançou.

O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP)negociou ontem com os presidentes da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da CAE, Luiz Otávio (PMDB-PA), a antecipação do depoimento de Palocci para as 15 horas de hoje. "Eu disse que o ministro está fazendo um grande trabalho para o País, não tem nada a temer e responderá a todas as perguntas", afirmou Mercadante, que nega ter sido sondado para o lugar de Palocci. "Precisamos parar com as intrigas. A crise política não pode contaminar a economia." Depois de Mercadante, Portugal e próprio Palocci se revezaram nos telefonemas.

"Acho que Palocci foi inteligente", disse o senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA). "Ele pode se sair bem e abafar a crise. Se não se antecipasse aos fatos, teria de se submeter às guerras das CPIs."

Para o relator da CPI dos Bingos, senador Garibaldi Alves (PMDB-RN), a tática do governo não deixa dúvidas: "É uma clara tentativa de proporcionar ao ministro a oportunidade de se consolidar no cargo."

Garibaldi contou que a estratégia obrigará a CPI a adiar os depoimentos marcados para hoje: o do presidente do Sebrae, Paulo Okamotto, convocado para explicar por que tirou do bolso R$ 29 mil para quitar dívida de Lula com o PT, e o de Afrânio Nabuco, acusado de fazer lobby para os dirigentes da Gtech.

No plenário, Palocci fará uma apresentação sobre economia, mas todos os senadores terão direito a fazer perguntas. "Isso aí é uma jogada", comentou o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), autor do requerimento de convocação de Palocci para depor hoje na comissão da Câmara que analisa o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). "No Senado, ele se sente mais seguro para falar do que na Câmara, porque até a oposição defende a sua política econômica", concluiu.