Título: Na simplicidade das marcas, a identidade dos produtos
Autor: Carlos Franco
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/11/2005, Economia & Negócios, p. B14
Há 45 anos, os hoje sexagenários arquitetos João Carlos Cauduro e Ludovico Martino abriram um escritório, o Cauduro e Martino, com o objetivo de criar identidades para marcas. ¿Embora formados em arquitetura, tínhamos nos voltado para o design, a comunicação gráfica e decidimos então oferecer nossos trabalhos¿, diz Cauduro. Desde então, criaram mais de 300 identidades visuais, que, mais que um simples desenho, são sinais cujo objetivo é ser a expressão de uma idéia com a qual empresas e produtos possam ser reconhecidos. Agora, reuniram essa produção no livro Marcas ¿ Trade Marks CM, que a Imprensa Oficial do Estado de São Paulo lança amanhã, na VI Bienal de Arquitetura, em edição bilíngüe. E o que o trabalho do Cauduro e Martino tem a ver com propaganda? Tudo, diz o próprio Cauduro, pois uma marca é a forma mais eficaz de atingir as pessoas, de relacionar idéias à forma e de dar conteúdo ao que se oferece. ¿Não é um desenho, é um sinal e, quanto mais simples, quanto mais forte, melhor¿, diz ele.
Criadores de identidades como a dos sorvetes Kibon, do Banespa, do Banco 24 horas, do Playcenter e do Metrô de São Paulo, esses dois arquitetos têm sempre a preocupação que as suas marcas possam ser reproduzidas e identificadas por adultos e crianças.
¿O grande segredo de uma boa marca é ser absolutamente simples, limpa, capaz de ser reproduzida com facilidade por ficar na memória e, mais que isso, despertar algum tipo de sensação¿, diz Cauduro, que critica o excesso de informações em marcas e elogia as mais simples, aquelas que são capazes de superar barreiras culturais, de serem globais, de estarem presentes em todo o processo de produção de uma empresa e ser o retrato desta produção. Ele cita o caso da Villares, para a qual criou com Martino a identidade visual. ¿Foi um projeto que emprestou um sinal forte de identificação, em todos os elementos, a ponto de ser possível, apenas passando os olhos pelas letras, identificar a Villares. É isso que se deve perseguir sempre.¿ Agora, Cauduro e Martino se debruçam na retomada de um projeto que criou a identidade visual da TV Cultura em meados dos anos 1970. ¿Desde a criação da marca, imaginamos as vinhetas, mas só agora esse processo foi retomado. Antes mesmo do `plim-plim¿ da TV Globo, tínhamos emprestado movimento e som à marca para fixar a identidade do canal. Felizmente, agora retomamos esta empreitada¿, diz Cauduro.
Considerado um dos mestres do design gráfico no País, Alexandre Wollner, de 78 anos, acha que, neste momento, as marcas precisam estar atentas para a sua difusão nos meios digitais, que, afirma, não podem, sob hipótese nenhuma, comprometer o conteúdo.
¿As marcas que correm atrás de estilos ou modismos não vieram para ficar. É possível emprestar a essas marcas elementos que as relacionem com um momento atual, sem que percam a sua forma ou que sejam poluídas pelo excesso de informação. É o caso dessa marca do governo Lula, `Brasil ¿ País de Todos¿. É suja demais, uma coisa que remete à Polônia, à Hungria e à Iugoslávia e não tem nenhum traço de brasilidade, a não ser na identificação de Brasil no texto. Caso contrário, seria impossível relacioná-la ao País.¿ Cauduro endossa e diz que essa marca é uma colcha de retalhos, ¿uma fantasia, com excesso de informação predestinada a não se perpetuar na memória¿.
Wollner é ainda mais crítico quando vê as marcas que criou em sua prancheta ganhando novos elementos na tentativa de atualização. ¿É um absurdo aquele arroba que identifica a internet invadindo a marca Itaú. Nunca a IBM faria uma coisa dessas, porque sabe que a marca é a expressão dos seus valores, a sua identidade, e não uma coisa secundária, que se possa mexer para acrescentar, a cada temporada, um elemento novo.¿
Ele também reclama das duas barras laranja que criou para evitar que as letras em preto do Itaú sofressem nas agências com a poluição das ruas e conseguissem se destacar. ¿Agora, o laranja ficou mais importante que as letras que emprestam ao Itaú a sua identidade.¿ Francesc Petit, da agência de publicidade DPZ, é outro criador de marcas que se irrita com as alterações realizadas na identidade de empresas. ¿Uma marca empresta valor a uma empresa. É sua comunicação mais direta e, se ela passa por mudanças, é porque essa identidade se perdeu. Pode se trazer ao consumidor um novo design de um Mercedes-Benz, mas sem a estrela, que é a sua marca, esse carro ficaria sem diferencial.¿
Petit fica orgulhoso de ter criado a identidade visual da Gol. ¿Os donos já haviam decidido o nome da companhia, então tínhamos de diferenciar esse `gol¿, uma expressão que está presente na vida do brasileiro. Decidimos dobrar a letra `o¿ para dar sonoridade e optamos por usar a cor laranja e traços que dessem dinamismo. Preparamos dos copos aos uniformes, passando pelos balcões e até pela pintura dos aviões, para que a Gol tivesse uma identidade única. O resultado está aí¿, diz, orgulhoso.
Para Petit, o tempo em que se procurava um letrista ou ilustrador para criar a marca ¿ seja o logotipo (letras) ou a logomarca (desenho) ¿ é coisa do passado. ¿Sem uma marca forte, a empresa fica vazia de conteúdo no mercado local e global.¿