Título: Salários têm de crescer com o País
Autor: Eleno José Bezerra
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/11/2005, Economia & Negócios, p. B2

A renda do trabalhador metalúrgico tem crescido com o Brasil. No ano passado, conquistamos 4% de aumento real. Neste ano, conseguimos aumentos de 3,5%, que é a previsão de crescimento da economia para 2005. No geral, uma recuperação de renda para os metalúrgicos de 7,5% acima da inflação de 11% do último biênio. Essa correlação entre crescimento econômico e renda do trabalhador, que os metalúrgicos têm alcançado, deve servir como modelo de desenvolvimento com distribuição de renda. A luta pela recomposição dos salários só tem um caminho: o crescimento da economia.

Trata-se de um caminho de mão dupla. Quando os salários aumentam, o consumo ganha impulso e, por conseqüência, a produção. Isso gera mais investimentos e empregos, girando para frente a roda da economia.

Um caminho para o alto, bem diferente do que vem sendo adotado pelo governo Lula. No modelo atual, a equipe econômica amarra a economia com os maiores juros reais do mundo, sufoca com a carga tributária - em que também somos campeões mundiais - e paralisa com a falta de investimentos sociais. E, depois, ainda comemoram que a economia cresce bem menos do que a de países semelhantes, como Índia, Rússia e China. Por aqui, o governo se vangloria de que a indústria cresceu 1,1% em agosto. Mas basta deixar de olhar para o próprio quintal para ver que em países em desenvolvimento o ritmo é muito mais intenso. A indústria da Índia cresceu 11,7%; da Argentina, 7,6%; do Chile, 5,2%; da Tailândia, 10,3%.

E mesmo com o crescimento do produto interno bruto (PIB) sendo baixo, fazer os salários acompanhá-lo tem sido a exceção, e não a regra. Os 50 sindicatos de metalúrgicos da Força Sindical no Estado de São Paulo têm usado a força de sua união e de sua capacidade de negociação. Se já não é fácil negociar em grandes segmentos, como eletroeletrônicos, é muito pior nas cerca de 6 mil empresas metalúrgicas da cidade que empregam até 100 trabalhadores. São negociações pulverizadas, em que muitas vezes se vence no detalhe e onde toda a atenção é pouca. Mas os aumentos reais, no final, valem o empenho.

A mesma relação entre desenvolvimento do País e recuperação da renda não ocorre, por exemplo, numa categoria grande como a dos bancários, na qual o crescimento do PIB não chega ao bolso do trabalhador. Os aumentos reais têm sido menores, e isso num setor em que os banqueiros têm tido lucros extraordinários, certamente os maiores beneficiados pela atual política econômica.

Para crescerem os salários é preciso crescer o País. É isso que tem que ter em vista quem atua na defesa do trabalhador. Nossa luta não é só na porta de fábrica nem nas mesas de negociação. É também para exigir um modelo econômico não excludente, que permita o desenvolvimento do País e deixe de favorecer os mais ricos, para olhar para quem mais necessita. Isso não só é possível como é urgente. A estabilidade já foi conquistada, o que se discute agora é o ritmo com que os obstáculos dos juros e dos impostos vão ser tirados do caminho.

E o governo Lula vai muito, muito devagar. Para brecar o desenvolvimento, agiu rápido - não por acaso, o crescimento foi zero no primeiro ano de governo. Agora que tem de agir com decisão vai com o pé no freio. Mesmo entre os mais otimistas, a taxa básica de juros da economia não será menor que 18% ao ano até o final de 2005. Mesmo a chamada MP do Bem é insuficiente para um país em que o cidadão trabalha quatro meses e meio do ano só para pagar impostos, e tome burocracia. Falta ousadia, falta coragem, falta atitude.

A mesma atitude que estão tendo os metalúrgicos, que, unidos e organizados, têm buscado a sua fatia do bolo do crescimento. A César o que é de César, aos trabalhadores o que é dos trabalhadores. Na década da crise brava, a conta sobrou para os trabalhadores, que viram suas rendas despencarem. Agora que o País reage, eles têm o direito de colher os frutos. E têm feito isso com consciência, garra e união.

Fica o exemplo. Se o presidente Lula, que já foi metalúrgico, esquecer um pouco o deslumbramento do poder e voltar a olhar para seus antigos companheiros vai ver o que é a verdadeira luta por um país melhor. E, quem sabe, cria a coragem necessária para fazer o que precisa ser feito.