Título: OCDE aconselha País a pagar dívida
Autor: João Caminoto
Fonte: O Estado de São Paulo, 30/11/2005, Economia & Negócios, p. B4

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aconselhou o governo brasileiro a usar o excesso obtido sobre a meta de superávit de 2005 para o pagamento de dívidas, em vez de elevar os gastos no final deste ano. Essa avaliação se alinha com a posição do ministro da Fazenda, Antonio Palocci, que defende uma folga fiscal maior para reduzir a vulnerabilidade do País. E diverge da sugestão da ala liderada pela ministra-chefe da Civil, Dilma Rousseff, que propõe um aumento dos gastos públicos, reduzindo o superávit primário mais próximo à meta de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB).

"O superávit primário consolidado está bem acima da meta de 4,25% do PIB para o final deste ano, principalmente por causa de uma vigorosa arrecadação", diz a OCDE em seu estudo semestral "Perspectiva Econômica", no qual avalia a economia mundial. "Seria aconselhável usar essa poupança acima da meta para pagar dívida, em vez de se permitir uma expansão fiscal no final do ano."

Nas últimas semanas, o governo fez várias liberações de recursos para tentar tirar alguns projetos importantes do papel. Mas as liberações atrasadas não devem surtir efeito, pois não há tempo para licitar as obras ou os projetos ainda não estão maduros.

O economista Luiz de Mello, responsável pelas análises macroeconômicas sobre o Brasil na OCDE, explicou por que o organismo sustenta que o governo brasileiro não deveria promover uma expansão fiscal no final deste ano.

"Já que se chegou a um volumoso excesso sobre a meta de superávit primário, acreditamos que a melhor maneira de utilizá-lo é no pagamento da dívida, fortalecendo assim ainda mais a trajetória de redução de vulnerabilidade do País dos últimos anos", disse Mello em entrevista ao Estado. "Não acreditamos que o melhor caminho seja uma expansão fiscal intensa e concentrada neste fim do ano e início de 2006, que injetaria uma maior demanda na economia."

Mello avalia que a meta de superávit primário de 4,25% do PIB é suficiente para reduzir gradualmente, no longo prazo, a relação entre dívida e PIB. "Mas é óbvio que, se essa meta for superada, a dívida seria reduzida de forma mais rápida."

Em seu estudo, a OCDE observa que o rascunho da lei orçamentária para 2006-2008 continha uma limitação gradual para os gastos primários correntes em nível federal em relação ao PIB. "Infelizmente, o nosso documento foi concluído antes dos últimos acontecimentos no Brasil, que parecem ter afastado, pelo menos por enquanto, essa possibilidade", observou.

No geral, o estudo contém uma avaliação positiva sobre a economia brasileira. Segundo a OCDE, o crescimento da produção no País tem ganhado ritmo desde o segundo trimestre e deverá ganhar mais fôlego no curto prazo. "O consumo privado tem sido resistente e o investimento está em alta", disse. "A balança comercial e a conta externa corrente continuam registrando superávits saudáveis, apesar da crescente demanda por importações resultante do fortalecimento do real."

Segundo o estudo, a economia brasileira deverá crescer 3,2% neste ano, 3,7% em 2006 e 3,9% em 2007. A OCDE, no entanto, observa "que o gerenciamento macroeconômico prudente precisa continuar ancorando as expectativas" do mercado. Ela observa que a queda da inflação abriu caminho para o atual processo de declínio dos juros, e a meta inflacionária para o fim deste ano poderá ser atingida. "A performance fiscal continua forte, beneficiando-se de vigorosa arrecadação, e uma queda maior da relação entre a dívida e o PIB entre 2005 e 2007 seria desejável."

Apesar de estar otimista com a economia brasileira, a OCDE observa que há riscos para essa previsão, nos campos inflacionário, político e externo. "Na frente doméstica, o principal risco é a extensão na qual a oferta vai se expandir de acordo com o fortalecimento da demanda, afastando a preocupação com a inflação", disse. "O calendário político, com a eleição presidencial em outubro de 2006, poderá também adicionar incerteza para a perspectiva."

No cenário externo, acrescentou o organismo, a manutenção de preços do petróleo elevados e uma reversão das condições do mercado financeiro global - que reduziria o apetite de investidores por ativos de mercados emergentes - também são fatores de risco para os próximos meses.