Título: Regulamentação da escuta espera por votação
Autor: Angélica Santa Cruz
Fonte: O Estado de São Paulo, 27/11/2005, Metrópole, p. C1,3

Anteprojeto estabelece limites para a avalanche de interceptações que invadiu as investigações policiais

Como mostra a maioria das operações policiais de grande repercussão feitas pelas Polícias Civil e Federal, a arapongagem telefônica rivaliza com a busca e apreensão pelo título de maior substituto da investigação científica. Edson Cholbi Nascimento, o filho do rei Pelé, foi parar atrás das grades por conta de três minutos decisivos de conversa com um traficante. O ex-prefeito Paulo Maluf e seu filho Flavio, os juízes pilhados na Operação Anaconda, Rogério Buratti, o contrabandista Law Kin Chong e o pagodeiro Belo também falaram demais ao telefone. As escutas legais são hoje tão fundamentais para as operações policiais que explicam fenômenos como o excesso de celulares nas mãos dos presidiários. Apesar disso, provocam polêmica porque costumam colocar em risco o direito fundamental à privacidade. Em espera por votação no Congresso Nacional, um anteprojeto traz diretrizes para tentar colocar alguma ordem no festival de arapongagem que assola a nação.

Os limites para as escutas legais são estabelecidos pela Lei 9.296 e são descritos como uma medida para casos excepcionais. Ainda assim, a lei é considerada imprecisa por muitos, porque permite a interceptação para qualquer crime com pena de reclusão.

"Já crimes de detenção que muitas vezes só podem ser provados por meio de escutas, como o de ameaça, ficam de fora", explica o professor de Processo Penal da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP) Antônio Magalhães Gomes Filho, que integrou uma comissão encarregada pelo Ministério da Justiça de montar um anteprojeto que regulamenta a escuta telefônica.

Formado por cinco juristas, o grupo que elaborou o anteprojeto foi convocado pelo ministro Márcio Thomaz Bastos logo após o escândalo em que o senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) foi acusado de pegar carona em uma autorização judicial para incluir na lista números de telefone de alguns desafetos.

Depois de meses de conversas com juízes, delegados, integrantes do Ministério Público e técnicos representantes de empresas de telefonia, o grupo elaborou algumas mudanças. Entre elas, está o rol de crimes que podem motivar as interceptações. O anteprojeto lista 14 casos, que vão do tráfico de entorpecentes, armas e espécimes da flora silvestre a lavagem de dinheiro, seqüestro, homicídio, ameaça e crime organizado.

O texto também aumenta a responsabilidade dos juízes na autorização dos pedidos, que precisaria pedir relatórios detalhados de que as linhas telefônicas enumeradas têm relação com a investigação. E determina a centralização das escutas em uma base montada pela polícia. Atualmente, elas podem ser feitas em qualquer distrito equipado.