Título: Dilma e Palocci acertam trégua com superávit de 4,25% em 2006
Autor: Vera RosaLuciana Nunes Leal
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/11/2005, Nacional, p. A4

Depois de 20 dias de bombardeio, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, e a chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, estabeleceram uma trégua para a boa convivência no governo. Em reunião na manhã de domingo na casa de Dilma, vizinha de Palocci, os dois lavaram a roupa suja e chegaram à conclusão que as divergências têm de ser debatidas internamente, e não em público. A pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o discurso oficial do governo é de que o superávit primário será de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB) neste e no próximo ano, conforme prevê a Lei de Diretrizes Orçamentários (LDO). Neste ano, porém, o superávit - que é a economia de gastos para pagamento dos juros da dívida - já ultrapassou essa meta. Apesar das críticas de Dilma, que sempre defendeu a liberação de verbas para investimentos, o resultado acumulado de janeiro a outubro, divulgado ontem, foi de 5,97% - o que indica a continuidade do arrocho - e deve encerrar o ano na casa de 5%. Isso aconteceu porque, ao executar o Orçamento, a equipe econômica reteve recursos "na boca do caixa", agindo com cautela na hora de soltar o dinheiro. A preocupação de Lula é que o fato não se repita no ano que vem, quando pretende disputar a reeleição. Em resumo, o presidente quer que o governo gaste mais em 2006.

Ao dizer que a polêmica entre Dilma e Palocci é "página virada", o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner, acabou admitindo, num ato falho, que Lula é candidatíssimo. "As questões de futuro terão momento próprio para serem discutidas e acredito que seja na elaboração do projeto de governo para o segundo mandato", afirmou. "Esta é a hora de governar e se governa com decisões já tomadas. Uma mudança para cima ou para baixo no superávit não está em discussão."

Ao chegar ontem para a reunião de coordenação política - a primeira em que Dilma e Palocci apareceram juntos diante do presidente, após o bate-boca -, Lula não conteve a curiosidade. "Vocês se acertaram?", perguntou. Com a resposta afirmativa, o presidente avisou que fará reunião ministerial, na segunda quinzena de dezembro, para unificar o discurso da equipe.

Ainda nesta semana, provavelmente na quinta-feira, haverá reunião da Junta Orçamentária - trinca formada por Casa Civil, Fazenda e Planejamento - para definir as prioridades do governo e os investimentos. A idéia é empenhar recursos do Orçamento agora para liberar a verba em janeiro e fevereiro, autorizando o início das obras num ano eleitoral, que, tradicionalmente, é mais curto.

PROMESSAS

Foi Palocci que tomou a iniciativa de procurar Dilma, no domingo. Disse que não tinha nada de pessoal contra ela nem a intenção de alimentar o fogo amigo. Achava, porém, que a colega agia de forma errada ao tornar o embate público e logo num momento em que ele estava vulnerável, acossado por denúncias que, na sua avaliação, têm por trás "interesses políticos".

Dilma respondeu que não queria encostá-lo contra a parede. Mas foi franca: afirmou ter a impressão que ele escondia números do superávit primário para fazer poupança maior. O resultado desse esforço fiscal, observou ela, é que muitos projetos na área social e de infra-estrutura não saíram do papel.

Na conversa, estabeleceram métodos de trabalho: daqui para a frente, um não terá ingerência no território do outro. Essa, ao menos, é a promessa antecipada de ano-novo. A Junta Orçamentária continuará do mesmo jeito. Palocci queria Dilma fora da Junta, e cedeu. Ela desejava que o ministro não tivesse controle "exclusivo" da execução financeira do Tesouro, e também recuou. Na prática, os dois mantêm suas posições, mas a queda-de-braço não será para consumo externo.