Título: Kirchner troca Lavagna por Felisa
Autor: Ariel Palacios
Fonte: O Estado de São Paulo, 29/11/2005, Economia & Negócios, p. B8

A economista Felisa Miceli foi, até o meio-dia de ontem, a presidente do Banco de la Nación. À tarde, tornou-se ministra da Economia da Argentina. Felisa, amiga da primeira-dama, senadora Cristina Kirchner, substitui Roberto Lavagna, cuja saída era esperada há meses por causa das divergências na política econômica que tinha com o presidente Néstor Kirchner. O presidente também não estava confortável com as aspirações presidenciais do ministro que, para complicar, não conseguiu deter a inflação, o maior pesadelo deste governo. Mas, apesar disso, Lavagna foi um ministro da Economia popular. Grande parte dos argentina considera que foi ele quem conseguiu evitar que a crise financeira, econômica e social de 2001-2002 fosse mais grave. Ontem, ao se despedir, Lavagna disse que foi uma "tarefa titânica".

MERCADO

O analista Joaquín Morales Solá acredita que Felisa, discípula de seu antecessor, representa "continuidade" da política econômica de Lavagna e que os mercados não precisam temer a troca - ontem fecharam em queda de 4,48%, enquanto o dólar passou de 2,99 pesos para 3,02 pesos. O nervosismo deverá durar até a nomeação da nova equipe econômica.

"Ela tem uma personalidade diferente", explicou. O vice-ministro da Economia, Orlando Ferreres, lembrou que Lavagna e Kirchner são explosivos e egocêntricos, daí terem entrado em choque. Felisa Miceli é considerada uma pessoa "obediente".

E, por isso, diz o analista político Eduardo Fidanza, "a partir de agora o presidente não tem nenhuma figura competitiva em seu gabinete. Ninguém rivaliza com ele. Kirchner continua com sua lógica de concentrar poder".

Na quarta-feira, Lavagna acusou empreiteiras de superfaturarem custos de obras públicas e confrontou empresários ligados ao ministro do Planejamento, Julio De Vido, homem de confiança de Kirchner. Na quinta-feira, Kirchner fez duras críticas aos donos de supermercados - críticas que Lavagna tentou minimizar logo no dia seguinte, o que irritou o presidente.

Kirchner não quis falar com Lavagna desde sexta-feira e ontem o convocou à Casa Rosada, sede do governo, para demitir o ministro.

BANDEIRA

Ao entrar na sala onde realizou a coletiva para a imprensa, Lavagna, com olheiras mais profundas do que o costumeiro, tropeçou nervoso em uma bandeira argentina. Na conversa com os jornalistas, admitiu que Kirchner havia pedido sua renúncia. Cauteloso, Lavagna disse que compreendia o pedido, já que o governo, após vencer as recentes eleições parlamentares entrava em uma nova etapa, na qual era necessária uma reforma ministerial.

Fazendo uma avaliação de sua gestão, agradeceu à sua equipe: "Há quatro anos, com meu time, pegamos o país na maior crise de nossa História." Segundo Lavagna, a economia argentina atualmente pode ser considerada "sólida". Lavagna quebrou sua costumeira sobriedade ao despedir-se com um "Viva Argentina!".