Título: Álcool combustível se consolida como alternativa ao petróleo
Autor: Eduardo Magossi
Fonte: O Estado de São Paulo, 02/12/2005, Economia & Negócios, p. B18

A produção de álcool combustível tem crescido de forma vertiginosa no mundo todo. A expansão foi de 47,6% nos últimos cinco anos, e a produção deve atingir 46 bilhões de litros neste ano. Com investimentos previstos de US$ 6 bilhões na construção de novas usinas nos próximos dez anos apenas no Brasil, a expectativa é de que esta produção aumente ainda mais. Um volume semelhante de investimento está sendo estimado para os EUA e para Ásia e Europa combinados. Até o papa da informática, Bill Gates, anunciou que está investindo na produção de álcool de milho na Pacific Ethanol Inc., a maior usina da costa leste dos EUA. No entanto, deste total de álcool produzido, menos de 0,1% está protegido contra risco de variação de preço. Tal proteção se faz via mercado futuro, onde o preço do produto ideal pode ser fixado tanto por quem vende quanto por quem compra, evitando assim surpresas provocadas por flutuações exageradas nas cotações.

"O mercado de álcool está se expandindo sem instrumentos eficientes que eliminem o risco de preço do produto", explica Michael McDougall, diretor da Fimat Futures, uma das principais corretoras mundiais do setor sucroalcooleiro. Para McDougall, é essencial que o setor comece a se preocupar com a criação de um mecanismo eficiente. "Os cenários macroeconômicos para os próximos anos indicam tempos turbulentos e estes investimentos esperados dificilmente serão realizados integralmente sem instrumentos de proteção de risco."

O analista explica que os catalisadores destes investimentos foram os preços recordes de energia - petróleo, óleo para aquecimento e gás natural - registrados recentemente, o que acabou trazendo para primeiro plano a demanda por combustíveis alternativos. "A alta dos preços de energia levou muitos produtores a buscar maiores ganhos no mercado de etanol. Muitos deixaram de produzir alimento para gado, por exemplo, para entrar no setor de álcool", disse.

Para McDougall, o principal problema é o fato de o sucesso do etanol estar ligado basicamente ao atual preço elevado do combustível fóssil, o petróleo. "Embora muitos analistas acreditem que as reservas de petróleo estão no fim, isto não significa que o risco de preço vai cair. A verdade é que o mercado de combustíveis fósseis continuará a ter uma grande flutuação de preços, tanto para cima como para baixo", diz. "Então, é essencial que o mercado de álcool tenha um mecanismo de proteção eficiente para evitar que os preços variem com a volatilidade do petróleo."

Atualmente, são poucos os contratos futuros de álcool existentes. Combinados, estes contratos representam menos de 0,068% da produção mundial. O contrato de álcool anidro da Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F), por exemplo, está com a metade da liquidez que tinha em igual período de 2004.

Na Bolsa de Nova York, a Nybot, o contrato de etanol começou bem, prometia ser um sucesso na época do lançamento, mas acabou morrendo na praia por falta de liquidez. Segundo o economista da Nybot Bernard Savaiko, a bolsa criou o contrato a pedido dos próprios produtores, principalmente do Brasil, mas a bolsa sabia que a possibilidade de o contrato não ter liquidez era grande. "Geralmente tem-se um mercado e então cria-se um contrato futuro e não o contrário, como aconteceu com o contrato da Nybot." Savaiko disse que mudanças devem ser feitas no atual contrato e ele deve ser relançado, mas não quis especificar um período. "Não desistimos do etanol."

Plínio Nastari, da consultoria Datagro, avalia que o contrato foi criado cedo demais, sem que houvesse a consolidação de um mercado mundial. Outro ponto a ser considerado, segundo ele, foi o fato de, nos últimos dois anos, o mercado doméstico de álcool ter se expandido de forma expressiva com a criação dos carros bicombustíveis, o que fez com que a produção brasileira ficasse no mercado interno e as exportações se estabilizassem. "Além disso, as especificações do contrato da Nybot não atendem os tipos de álcool existentes em várias partes do mundo. É necessário que haja uma homogeneização nestas normas para se criar realmente um contrato que seja interessante para atrair interesse de produtores de todo o mundo", afirma.

A falta de liquidez dos contratos de álcool tem feito com que outros futuros estejam sendo utilizados para se proteger do risco de preço, o que acaba criando uma proteção ineficaz e até desvios de preço. "Os contratos de açúcar da Nybot e os de gasolina estão sendo utilizados para reduzir o risco do álcool", diz McDougall, "principalmente por corretoras e usinas que operam o álcool brasileiro".

Apesar de o açúcar ser o produto que tem mais correlação com o álcool, pelo fato de a cana ser a matéria-prima em comum na produção, é o nível de preço da gasolina que guia a demanda por álcool. "Mas utilizar a gasolina para se proteger do álcool é arriscado porque os preços da gasolina estão mais correlacionados a problemas políticos nos países produtores ou políticas governamentais do que com o mercado de álcool", diz.

"Por isso, com a expansão deste mercado, é necessário que seja feito um esforço mais concentrado na criação de instrumentos de proteção de preço para o etanol." Para o analista, isto pode ser feito tanto criando um contrato mais redondo, perfeito, ou encontrando formas de impulsionar e dar suporte para os atuais contratos.