Título: Médicos cubanos dão ar revolucionário à Venezuela
Autor:
Fonte: O Estado de São Paulo, 04/12/2005, Internacional, p. A22

Como parte de ampla aliança entre os dois países, Cuba manda médicos, dentistas e professores e recebe petróleo barato

CARACAS -A Missão Bairro Adentro trouxe 5 mil médicos, dentistas e professores de educação física cubanos para a Venezuela. O convênio é parte da ampla aliança entre os dois países, que inclui o fornecimento de petróleo barato para Cuba. Com a Venezuela assumindo o antigo papel da extinta União Soviética, o regime cubano, menos necessitado de moeda forte, recobrou parte do fervor ideológico perdido, recuou na relativa liberalização da economia e passou a reprimir a tímida iniciativa privada. Cartão postal do governo venezuelano, a missão está cercada de certo mistério: os cubanos estão proibidos, por seu governo, de dar entrevista. Dois deles, no entanto, concordaram em conversar com o Estado, desde que suas identidades não fossem reveladas. Eles se apressam a desmentir a versão da oposição venezuelana, de que não são médicos, mas paramédicos.

Os profissionais, cuja missão dura três anos, continuam recebendo seus salários em Cuba. Na Venezuela têm alojamento gratuito ¿ uns moram nas sedes das administrações regionais, outros em casas de família ¿, recebem cesta básica e o salário mínimo venezuelano, de 400 mil bolívares (pouco mais de R$ 400). O salário é simbólico: supõe-se que eles não vêm por dinheiro, mas em ¿missão¿.

Na ponta do lápis, dá para fazer um modesto pé de meia. Habituados ao sistema estatal, os cubanos se espantam com a ¿mercantilização¿ da saúde. ¿Aqui se fazem remendos paliativos para os mais pobres, que não têm dinheiro para tratamentos mais caros, ou simplesmente se arrancam os dentes¿, diz um dentista. ¿Como o interesse é vender remédios e tratamentos, aqui não há medicina preventiva, só curativa¿, espanta-se um clínico geral.

Seu atendimento, porém, resume-se à medicina primária. Para coisas mais complicadas, venezuelanos pobres têm de enfrentar os hospitais públicos. Num certo sentido, as ¿clínicas populares¿ dos cubanos, com instalações simples, mas relativamente eficazes, em comparação com o que os mais pobres tinham antes, são um pequeno pedaço da ilha de Fidel Castro na Venezuela. E lhe dão um ar de revolução socialista.